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quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Gladiador 2 - Uma Trajetória Política além da Nostalgia

Gladiador 2 | Paramount Pictures


Gladiador 2 não foge de ser uma grande homenagem ao primeiro filme, com algumas pequenas referências, mas não o utiliza apenas como um afago nostálgico barato. Aqui o objetivo de Scott tem como foco mostrar uma jornada do mundo da Roma antiga, mas que converse com o tempo de seu lançamento e com uma nova geração que possa se interessar por aquele universo. A obra em nenhum momento foge de sua proposta que chega a ser bem próxima do primeiro filme, mostrando lutas com bastante sangue, bem coreografadas e agora utilizando muito mais o CGI. Importante enfatizar que mesmo com a utilização exacerbada dos efeitos especiais, não é algo que afete tanto a experiência visual, já que Scott dá espaço para a parte técnica na tela. 

Um dos pontos que o filme também tem à seu favor é o trabalho de elenco, onde todos conseguem ter espaço para atuar, ter um desenvolvimento de personagem sucinto e conseguem entregar atuações maduras e que casam com o espaço em que acontece a história. Enfatizo aqui o trabalho de Denzel Washington que faz o personagem mais articulado e tem como função ser um dos condutores de toda a narrativa acontecer como deve acontecer. 

Paul Mescal consegue ser um personagem principal que faz jus ao seu antecessor, Maximus, e consegue servir como uma nova forma de condução do discurso de Scott nesse filme. Enquanto a primeira obra segue Maximus em busca de vingança pela morte de seu filho e sua mulher, aqui Lucius toma outro caminho. Mesmo com o começo sendo um filme que parece querer seguir a mesma linha de motivação do protagonista anterior, aqui vemos uma condução completamente oposta. 

Enquanto a vingança era o pilar principal do primeiro filme, aqui o foco se encontra em uma busca de uma utopia que foi entregue à um garoto que se decepciona com a realidade. A corrupção continua, o entretenimento com a violência é maior do que nunca, doenças se alastrando, fome e a raiva do povo em crescente. Além dos dois imperadores antagonistas, Geta e Caracalla, que são o perfeito estereotipo de crianças mimadas governando um império, mostrando Scott zombando das figuras de poder que prevalecem até hoje. 

Lucius busca no início de sua jornada, vingança. Mas ao longo de sua jornada, o seu foco é a busca de uma Roma que tenha dignidade e que possa finalmente prevalecer em paz. Claro que não faz sentido tentar conectar esse filme com a realidade histórica, já que a proposta desde o primeiro filme é uma releitura fictícia de fatos históricos, mas é pertinente a forma que Scott faz um retrato digno de um cenário passado sendo bem atualizado depois de 24 anos.  

O filme em nenhum momento se esconde em prover um entretenimento pirotécnico com suas batalhas exageradas, assim como também não se esquiva em conduzir uma narrativa focada na condução política. A jornada do personagem Macrinus, de Denzel Washington, mostra como aqueles que são oprimidos por um império, podem fazer de tudo para que ele despenque. Sua trajetória se torna um dos pontos feitos com melhor exatidão comparado com os outros. 

Necessário apontar também o fato da direção condensar muitos pontos narrativos em momentos rápidos e acelerados de forma deslocada, principalmente na última meia-hora de filme e na relação de Lucius com a sua mãe, Lucilla(ainda sendo interpretada pela Connie Nielsen). A conclusão da obra também fica deslocada em comparação com toda a obra, sem contar a primeira motivação da trajetória de Lucius que se torna mal concluída e posta de lado. 

Gladiador 2 não chega a ser algo do mesmo nível de seu antecessor, mas consegue ser diferente de forma positiva. Sendo um entretenimento para os amantes do primeiro filme, tendo o exagero nas lutas e nos efeitos especiais e tendo ótimas atuações que conseguem ofuscar algumas das problemáticas do filme. 

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Sorria - Sorriso Não Resplandecente

Sorria | Paramount Pictures


Após um paciente cometer um suicídio brutal em sua frente, a psiquiatra Rose é perseguida por uma entidade maligna que muda de forma. Enquanto tenta escapar desse pesadelo, Rose também precisa enfrentar seu passado conturbado para sobreviver.

 O longa-metragem é uma obra de terror psicológico dirigida por Parker Finn, cineasta também responsável pelo curta-metragem que originou o filme. A narrativa se aprofunda em temas complexos como trauma, culpa e desespero, levando o espectador a uma jornada de crescente angústia e reflexão. A trama gira em torno de Rose, que, ao ser confrontada por eventos perturbadores, começa a perder a distinção entre realidade e alucinação, mergulhando progressivamente em uma espiral de paranoia e medo inescapável. O filme se destaca por sua habilidade em evocar uma sensação de claustrofobia emocional, explorando como experiências traumáticas podem corroer a sanidade e a percepção da realidade. A direção de Finn é eficaz em criar uma atmosfera opressiva, onde a tensão se acumula gradualmente, refletindo a desintegração mental da protagonista.

 Os sorrisos do filme são profundamente perturbadores por sua estranheza desconcertante e natureza antinatural. O que deveria ser uma expressão de alegria e conforto é transformado em algo sinistro e ameaçador. Esses sorrisos são amplos, rígidos e fixos, criando uma sensação de que algo está muito errado. A forma como os personagens, sob a influência da entidade, mantém o sorriso enquanto seus olhos permanecem frios ou apáticos, gera uma dissonância aterrorizante, como se a expressão fosse uma máscara distorcida.

 A trilha sonora e o design de som desempenham um papel crucial na experiência do filme, com sons sutis e cuidadosamente elaborados que intensificam a sensação de perigo iminente e amplificam o clima de tensão. A utilização de ruídos inesperados e a manipulação de silêncios criam uma atmosfera inquietante, mantendo o espectador em constante estado de alerta. Esses elementos sonoros não apenas complementam a narrativa, mas também se tornam uma extensão da psicologia da protagonista, refletindo sua deterioração mental.

 Sosie Bacon, no papel principal como a Dra. Rose Cotter, oferece uma performance intensa e convincente, capturando com precisão o desespero e a deterioração mental de sua personagem à medida que a entidade sobrenatural a assombra. Ela transmite de forma eficaz a crescente paranoia e o isolamento de Rose, tornando a descida dela ao terror e à loucura crível e emocionalmente ressonante. Seus olhares perdidos, expressões de pânico contido e a vulnerabilidade em momentos de silêncio contribuem para criar uma conexão profunda com o público.

 O ponto negativo é o desenvolvimento raso de certos personagens e relações. A protagonista, Rose, é bem explorada, mas os coadjuvantes, incluindo o interesse amoroso e outros colegas de trabalho, são pouco desenvolvidos, servindo apenas como suporte para os conflitos internos da protagonista ou para impulsionar a trama. Isso resulta em um elenco que não contribui de forma significativa para a complexidade emocional do filme. Além disso, o filme se estende demais, tornando-se cansativo em sua segunda metade. O simbolismo relacionado ao trauma, que é central na trama, embora interessante, é tratado de forma superficial. A ideia de que a entidade maligna se alimenta do sofrimento humano poderia ser mais explorada, com uma abordagem mais profunda e sofisticada. O resultado é uma trama que parece prometer mais do que entrega, ficando presa a uma estrutura genérica e previsível. O filme pode ser criticado por sua dependência de clichês do gênero, o que pode diminuir o impacto de algumas de suas reviravoltas.

Sorria é um terror psicológico que mergulha o espectador em uma atmosfera densa, abordando de forma impactante temas como trauma e culpa, enquanto acompanha a inquietante jornada de deterioração mental da protagonista. Porém, a narrativa se alonga desnecessariamente, tornando a segunda metade repetitiva, com sustos previsíveis que diminuem a tensão e enfraquecem o impacto do medo. Ainda assim, Sorria deixa uma marca inquietante, ecoando suas mensagens sobre trauma e sanidade.

Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator em formação e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Sorria 2 - A Sequência que Ultrapassa o Original em Perturbação e Qualidade

Sorria 2 | Paramount Pictures

Prestes a embarcar em uma nova turnê mundial, a sensação pop global Skye Riley começa a vivenciar eventos cada vez mais aterrorizantes e inexplicáveis. Sobrecarregada pelos horrores e pressões crescentes da fama, ela deve enfrentar seu passado sombrio para retomar o controle de sua vida antes que ela saia do controle.

Enquanto o primeiro filme abordava traumas pessoais e uma entidade sobrenatural que se manifestava através de sorrisos perturbadores, essa sequência introduz temas como a fama, a pressão psicológica e o terror de um passado sombrio. O enredo original focava em uma maldição ligada a traumas e culpa, mas a continuação expande essa premissa ao explorar os desafios emocionais da vida sob os holofotes e o terror psicológico decorrente das pressões públicas. A trama mistura elementos sobrenaturais com uma crítica social sobre a cultura das celebridades. Essa mudança de cenário levanta questões sobre como o terror pode servir para criticar a indústria do entretenimento e a exploração da imagem pública. Contudo, há o risco de que o foco em uma figura famosa possa diluir a profundidade emocional do primeiro filme, que se destacou pelo tratamento sensível de temas universais e pessoais.


O filme evita jumpscares gratuitos, aqueles que surgem sem uma construção adequada de tensão ou relevância para a trama. Aqui, os sustos são astutos, eficazes graças ao uso cuidadoso de efeitos visuais e sonoros, além dos diversos artifícios que a entidade utiliza para gradualmente desestabilizar sua vítima, levando-a ao limite da sanidade. Esses momentos funcionam não apenas pelo choque imediato, mas também pela forma inteligente com que a tensão é construída. A entidade manipula o ambiente ou surge em momentos estrategicamente calculados, criando uma atmosfera opressiva e constante. Cada aparição vai além de ser apenas um susto, servindo como uma peça de um complexo quebra-cabeça psicológico, que desestabiliza a protagonista e faz o público compartilhar de sua paranoia e desespero crescentes. O terror não se limita ao susto passageiro, mas se estende, deixando o espectador em constante estado de alerta, preso em um medo duradouro e difícil de escapar.


O filme peca por alongar demais seu ritmo, tornando-se cansativo em vários momentos e prejudicando a fluidez da narrativa. Sequências que poderiam ser mais ágeis acabam se estendendo sem propósito claro, fazendo com que o espectador perca o envolvimento com a trama.


Naomi Scott está excepcional no papel, entregando com maestria o medo e o sofrimento que sua personagem enfrenta. Seu olhar expressa o terror de maneira marcante, caracterizado por uma combinação poderosa de sutilezas e intensidade. O olhar assombrado dela é uma verdadeira janela para a vulnerabilidade da personagem, capturando a inquietação e o desespero que a situação provoca. Além disso, Naomi utiliza o silêncio e a pausa de forma eficaz, criando momentos de tensão que permitem ao espectador absorver a gravidade da situação. Essa entrega genuína transforma sua atuação em um dos pontos altos do filme, tornando-a memorável e impactante, enquanto sua vulnerabilidade ressoa profundamente com o público.


Sorria 2 se destaca pela expansão inteligente dos temas de seu antecessor, misturando terror sobrenatural com uma crítica afiada à cultura da fama e às pressões psicológicas que acompanham o estrelato. A nova abordagem adiciona uma camada de profundidade à narrativa, ao explorar como o horror se manifesta em um contexto de celebridade, trazendo novos elementos que enriquecem a trama. Ao fazer essa transição, o filme não apenas mantém o suspense e o terror psicológico, mas também amplia a discussão sobre os impactos da fama na saúde mental. Dessa forma, consegue superar seu antecessor ao combinar sustos eficazes com uma crítica social relevante e atual.


Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator em formação e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

sábado, 17 de agosto de 2024

Janela Indiscreta - A relação do cinema com o Espectador.

Janela Indiscreta | Paramount 

 
Janela Indiscreta do diretor Albert Hitchcock foi o primeiro ponta pé para tantos outro filmes que vieram depois tendo o tema central o voyeurismo e o suspense por volta dele. O filme claramente é lembrado por essa marca que poucos conseguiram fazer algo do mesmo nível que o falecido diretor citado. Mas Janela Indiscreta é uma jornada que vai muito além de sua narrativa, sendo uma perfeita analogia sobre a relação do espectador com o filme. É possível enxergar isso nos seguintes trechos do filme: 

 Para começar, a introdução que equivale para o protagonista de forma igualitária a um espectador dentro de um cinema. Jeffries é um fotógrafo que se encontra enclausurado e sem poder sair do lugar por conta de sua perna quebrada, claramente não é idêntica a situação em comparação com o espectador. Porém o espectador, assim como Jeffries, entra em um espaço completamente fechado e cercado de cadeiras, as vezes ocupadas ou não, tendo apenas essa "janela" à nossa frente, onde queremos saber oque está acontecendo. Jeffries olha para o casal deitado na varanda e começa a rir quando cai a chuva e o casal se atrapalha para levar sua cama, entre outros pertences, de volta para o apartamento. O espectador ri junto com o protagonista. Jeffries se encanta com a sua vizinha da frente, que é uma bailarina que sempre está dançando e se aquecendo de um lado para o outro, e os espectadores compartilham do mesmo sentimento de encantamento pela beleza dessa personagem. 

Além desses dois vizinhos, tem muitos outros como recém casados, um músico, uma viúva e mesmo muito desses personagens não sendo cruciais para a obra, eles são essenciais para compreender o significado por trás das relaçôes humanas que acontecem nesse encontro de olhares entre espectador e tela. São tantas histórias para poder prestar atenção, mas Jeffries decide olhar atentamente para os vizinhos do segundo andar. O casal mais quieto, o menos expressivo, e o mais misterioso. O mais crucial é saber que Jeffries não viu seu vizinho matando sua mulher em nenhum momento, mas ele se negava a qualquer custo de acreditar na possibilidade de não ter acontecido exatamente oque ele acreditava. 

Hitchcock nesse momento enfatiza a necessidade do ser humano fantasiar algo que não se expressa, não fala, não se comunica. O ato de não pensar sobre esse casal quando a mulher não está mais presente no apartamento, é sufocante. Hitchcock faz em seu cinema o equivalente a alguém te segurar pelo pescoço e te obrigar a assistir algo gritando em seu ouvido "tem algo de muito errado ali e você precisa saber oque é" e na maioria das vezes, o espectador comum pode ser como o Detetive. O Detetive faz questão de sempre arrumar uma resposta para Jeffries, da mesma forma que um artista jamais deve tratar o seu espectador de acordo com Hitchcock.

Qual o sentido de entregar a resposta ao espectador? Qual a graça? E supondo que o Sr.Thorwald não tenha mesmo matado a esposa, não posso me permitir em fantasiá-lo como um assassino? O ato de fantasiar e imaginar é de extrema necessidade no cinema de Hitchcock e para muitos outros artistas. Mesmo que Sr. Thorwald não fosse o assassino, o filme continuaria a funcionar pelo simples fato de que Hitchcock consegue fazer o espectador sentisse sobre o personagem protagonista. Hitchcock nos faz fantasiar o mesmo. Mas a pergunta continua: oque isso tem a ver com o espectador dentro da sala de cinema? 

O que é o diretor(a) se não uma pessoa que te convida para um mundo de fantasia? Obviamente, nenhum espectador com mínimo de noção sobre a realidade vai buscar a Verdade Absoluta numa sala de cinema. E se tem aqueles que buscam, coitados. Vão ver a vida sempre como uma repetição de frustrações. E Hitchcock sabe disso ao fazer o espectador não tirar o olho da tela para saber oque aconteceu, mesmo se a resposta for ordinária. 

É necessário enfatizar a cena em que Jeffrie e sua namorada, Lisa, estão olhando a viúva com um novo pretendente quase chegando ao ato sexual. Na casa da viúva, o casal acaba discutindo e o jovem se retira de seu apartamento. Jeffrie, nesse momento, começa a pensar se oque ele realmente está pensando no que aconteceu seria apenas imaginação por estar tanto tempo preso em seu apartamento por conta da perna quebrada. Algo que acontece da mesma maneira com o espectador na sala de cinema, quando o espectador assiste uma obra e começa a refletir sobre si mesmo em meio a narrativa que ocorre à sua frente. 

Não chega a ser um desinteresse sobre a obra, mas um convite do inconsciente de volta para dentro de si, sem perder aquilo que acontece à sua volta. Pela lógica, Janela Indiscreta não é apenas um filme de suspense em cima do voyeurismo, mas a representação quase perfeita da relação sentimental entre espectador e obra. Uma incógnita linda e aterrorizante ao mesmo tempo.

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

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