Mostrando postagens com marcador marielle franco. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador marielle franco. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

MARIAS - Documentário que se aprofunda em apenas uma MARIA

Marias | Descoloniza Filmes


O documentário “Marias”, dirigido por Ludmila Curi, estreou em outubro de 2024. O filme é um "road movie" que viaja pelo Brasil e pela Rússia, destacando a vida de Maria Prestes, uma importante ativista nordestina que foi companheira do líder comunista Luís Carlos Prestes. Maria se engajou na luta pela reforma agrária e passou 40 anos ao lado de Luís Carlos, criando uma família e vivendo em exílio em Moscou. A obra, além de retratar sua trajetória, celebra outras figuras femininas que também marcaram a história, como Maria Bonita, Dilma Rousseff, Olga Benário e Marielle Franco.

O filme, por mais que se autointitule “Marias”, não se aprofunda, além da figura de Maria Prestes, como nas outras mulheres brasileiras: Dilma Rousseff, Olga Benário e Marielle Franco. Esta última, mesmo tendo tanta relevância nos últimos anos, é citada apenas nos minutos finais do documentário, como se fosse um recorte adicionado de última hora, limitado a um tempo de reportagem que provavelmente já assistimos no "Fantástico" da Rede Globo.

No que diz respeito à persona de Maria Prestes, o documentário consegue cumprir seu papel, retratando suas vivências desde a infância até o relacionamento com o famoso líder revolucionário Luís Carlos Prestes. A narradora consegue entrevistar Maria e, ao mesmo tempo, nos transportar a partir de manchetes e notas de jornais da época para nos localizar historicamente. Desde jovem, Maria já era ligada a pautas comunistas devido ao seu pai, João Rodrigues Sobral (conhecido como “Camarada Lima”).

Mas em nenhum momento o documentário sugere que Maria foi influenciada por seus familiares e marido em seus ideais políticos. Pelo contrário, ele reforça e afirma a autonomia que essa grande mulher pernambucana teve em suas atitudes e ativismo no decorrer de sua vida. Inclusive, em um trecho, o documentário faz questão de relatar um momento de conflito que ela teve durante atos de protestos e, mesmo assim, teve a certeza de continuar em sua luta política.

Através da entrevista com Mariana Prestes em 2017, filha de Maria Prestes (quando ambas moravam no interior do Piauí), podemos descobrir sobre a rotina da família durante o primeiro exílio de Luís Carlos Prestes. Mariana conta sobre as dificuldades que sofreram na época em sua infância, ela e mais oito irmãos (dois deles do primeiro casamento de Maria com Antônio Andrade).

Sua casa era constantemente vigiada devido à relação da mãe com um comunista exilado e, por isso, eles não tinham uma liberdade total para trafegar nas ruas e até mesmo adentrar em alguns terrenos que eram vigiados pelo governo. Isso demonstra como os filhos de Maria também foram afetados pelas perseguições políticas que seus pais sofreram e tiveram que se adaptar à realidade familiar. Apesar disso, Mariana soube contar momentos cômicos de sua vida jovem,mostrando que isso não prejudicou sua infância e que conseguia, mesmo nessa realidade, se divertir com seus irmãos como qualquer outra família.

Durante o segundo exílio de Luís Carlos Prestes, quando aconteceu a temida ditadura militar na Era Vargas, Maria teve que novamente se adequar a outra realidade, tendo que se exilar com seus nove filhos e seu marido na antiga União Soviética (URSS), onde passou nove anos de sua vida até receber a anistia brasileira e poder retornar ao seu país. Isso demonstra ainda mais a capacidade de resiliência dessa mulher, esposa e mãe que precisou fazer o que era melhor para sua família e se ambientar em uma língua e cultura totalmente diferente da sua.

A história de Maria é um espelho da sociedade brasileira. Quando percebemos o relato de Mariana, logo é possível notar a ausência do pai por questões de perseguições que vivenciava no período. A mesma diz, em um momento da entrevista, que não teve muito contato com ele, mas que o respeitava muito. Isso não exclui o fato de que tanto Mariana quanto seus irmãos tiveram um genitor ausente em sua família e que Maria Prestes foi uma mãe solo e uma mulher guerreira que teve que educar e sustentar nove filhos, passando por diversas adversidades ao mesmo tempo.

A falta da presença física de Maria no documentário durante as conversas não prejudicou sua história, só reforçou e deu mais visibilidade à sua trajetória –uma visibilidade que, muitas vezes, não é contada, retratada, ouvida de mulheres importantes no âmbito histórico brasileiro. Altamira Rodrigues Sobral Prestes (Maria Prestes) foi um símbolo de determinação nacional. Ela é só mais uma entre milhares de outras “Marias” nesse Brasil que passaram também pelas mesmas dificuldades e conseguiram ser resistentes perante as divergências da vida.

Isso me fez lembrar da minha mãe, também chamada Maria, e que também nasceu no Nordeste e foi mãe solo, precisando cuidar de quatro filhos e, ao mesmo tempo, trabalhar para arcar com as despesas de casa. Histórias como essas existem várias em nosso cotidiano, e cabe à sociedade desmitificar estereótipos de gênero, pois além das mulheres serem mães, esposas e profissionais, todas elas carregam a mesma humanidade, inseguranças e incertezas da vida que todos possuem.

“Marias” é um bom documentário no que tange à narração da vida de Maria Prestes, mas peca ao escolher o seu título e ao querer citar outras mulheres revolucionárias no espectro da esquerda política, pois não tem a mesma profundidade histórica desenvolvida como a de Maria Prestes. Todas elas foram grandes símbolos de ativismo político brasileiro, e não há como disponibilizar um tempo de tela para uma e apenas pincelar de forma rasa outras identidades tão influentes quanto foram para o país.



Autor:

Meu chamo Leonardo Veloso, sou formado em Administração, mas tenho paixão pelo cinema, a música e o audiovisual. Amante de filmes coming-of-age e distopias. Nas horas vagas sou tecladista. Me dedico à exploração de novas formas de expressão artística. Espero um dia transformar essa paixão em carreira, sempre buscando me aperfeiçoar em diferentes campos criativos.


Sombras no Deserto (2025) fica em cima do muro

  Sombras no Deserto (2025) | Imagem Filmes Crescer é um inferno: a passagem da infância à vida adulta é um ritual bastante natural e transf...