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sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Maximiliano Kolbe e Eu – O mártir da caridade

Maximiliano Kolbe e Eu | Kolbe Arte
 

Maximiliano Kolbe e Eu é daqueles filmes que costumo chamar de filme-afago! Daqueles que transformações ocorrem tanto na trama, como na vida de quem assiste.

Uma animação mexicana que tem como pano de fundo a vida do Padre polonês Maximiliano Kolbe, conhecido por seus atos de amor, devoção e caridade durante a Segunda Guerra Mundial. Kolbe foi preso e enviado ao campo de concentração de Auschwitz por proteger principalmente judeus. Lá, realizou o que se considera o maior dos sacrifícios: voluntariou-se para substituir um prisioneiro desconhecido condenado à morte, salvando a vida desse homem ao custo de sua própria.

A vida de Kolbe é narrada a partir da história de dois personagens considerados diametralmente opostos, que são DJ, um garoto em idade escolar, possuidor de uma rebeldia tal que sequer retira os fones de ouvidos para conversar e, Gunter, um idoso que também tem lá suas transgressões e que vive dividido entre sua casa e a igreja.

A história de ambos se cruza em determinado momento e a partir desse encontro, uma teia de sentimentos, sensações e inspiração entre eles e Maximiliano Kolbe é formada. Gunter faz questão de contar toda a história do Padre, do início ao fim, para DJ que, interessado, se comove e passa a se inspirar nas ações do Padre.

O cenário da vida do então Raimundo Kolbe, uma criança filha de uma família com pouquíssimos recursos financeiros e temente a Deus, era uma Polônia fria, acuada e escura (não importa se era dia ou não), em um período de guerras e entraves com a Alemanha nazista. O ar, cada vez mais rarefeito, era o próprio medo e invadia os pulmões de quem só queria exercer sua fé livremente.

Mesmo antes de se transformar no Padra Maximiliano Maria Kolbe, Raimundo já dava sinais de sua resistente fé na humanidade, sempre guiado por Maria Imaculada. Diante do cenário de guerra, ele tenta espalhar a palavra do amor e acolhimento a qualquer pessoa, independente da crença (ou descrença) religiosa, por confiar que na própria natureza humana existe um desejo contínuo de se aperfeiçoar.

Ao se entregar no lugar de um prisioneiro condenado à morte, o Padre reforça a total devoção à Maria Imaculada e aceita o que ele acredita ser os desígnios de Deus, condenando-se, ele próprio, à morte. Apesar disso, Max Kolbe não teme a morte. Aos seus olhos, fez o que deveria fazer.

A animação mexicana é dirigida por Donovan Cook e possui personagens fortes e interessantes. Apesar de ter um enredo, digamos que, conhecido, a forma como a vida do Padre foi narrada, acredito que prende o expectador até o fim, sedento pelo desfecho do filme. Os diálogos não são densos, mas cumprem bem o papel a que se destinam.

O mote do filme é fortalecer valores como fé, amor, caridade e, sobretudo, devoção. Talvez, depois de assistir ao filme, em alguma situação de angústia, é possível que se pergunte: “O que Max faria?”. Se isso acontecer, o propósito do filme foi atingido.

Maximiliano Kolbe foi canonizado pelo Papa João Paulo II e morreu como mártir. Com estreia prevista para 17 de outubro de 2024, essa é uma história vale a pena ser vista - e sentida.


Autora:


Lá em 2004 participei do meu primeiro filme. Ali apaixonei pelo cinema, mas como toda boa paixão, à la Jack e Rose, naufragou. A vida toma rumos e acabei seguindo outra área. Mas nada apaga uma boa paixão, né isso? Me chamo Carol Sousa e hoje falo e escrevo sobre cinema, quem sabe isso quer dizer amor...

Sorria 2 - A Sequência que Ultrapassa o Original em Perturbação e Qualidade

Sorria 2 | Paramount Pictures

Prestes a embarcar em uma nova turnê mundial, a sensação pop global Skye Riley começa a vivenciar eventos cada vez mais aterrorizantes e inexplicáveis. Sobrecarregada pelos horrores e pressões crescentes da fama, ela deve enfrentar seu passado sombrio para retomar o controle de sua vida antes que ela saia do controle.

Enquanto o primeiro filme abordava traumas pessoais e uma entidade sobrenatural que se manifestava através de sorrisos perturbadores, essa sequência introduz temas como a fama, a pressão psicológica e o terror de um passado sombrio. O enredo original focava em uma maldição ligada a traumas e culpa, mas a continuação expande essa premissa ao explorar os desafios emocionais da vida sob os holofotes e o terror psicológico decorrente das pressões públicas. A trama mistura elementos sobrenaturais com uma crítica social sobre a cultura das celebridades. Essa mudança de cenário levanta questões sobre como o terror pode servir para criticar a indústria do entretenimento e a exploração da imagem pública. Contudo, há o risco de que o foco em uma figura famosa possa diluir a profundidade emocional do primeiro filme, que se destacou pelo tratamento sensível de temas universais e pessoais.


O filme evita jumpscares gratuitos, aqueles que surgem sem uma construção adequada de tensão ou relevância para a trama. Aqui, os sustos são astutos, eficazes graças ao uso cuidadoso de efeitos visuais e sonoros, além dos diversos artifícios que a entidade utiliza para gradualmente desestabilizar sua vítima, levando-a ao limite da sanidade. Esses momentos funcionam não apenas pelo choque imediato, mas também pela forma inteligente com que a tensão é construída. A entidade manipula o ambiente ou surge em momentos estrategicamente calculados, criando uma atmosfera opressiva e constante. Cada aparição vai além de ser apenas um susto, servindo como uma peça de um complexo quebra-cabeça psicológico, que desestabiliza a protagonista e faz o público compartilhar de sua paranoia e desespero crescentes. O terror não se limita ao susto passageiro, mas se estende, deixando o espectador em constante estado de alerta, preso em um medo duradouro e difícil de escapar.


O filme peca por alongar demais seu ritmo, tornando-se cansativo em vários momentos e prejudicando a fluidez da narrativa. Sequências que poderiam ser mais ágeis acabam se estendendo sem propósito claro, fazendo com que o espectador perca o envolvimento com a trama.


Naomi Scott está excepcional no papel, entregando com maestria o medo e o sofrimento que sua personagem enfrenta. Seu olhar expressa o terror de maneira marcante, caracterizado por uma combinação poderosa de sutilezas e intensidade. O olhar assombrado dela é uma verdadeira janela para a vulnerabilidade da personagem, capturando a inquietação e o desespero que a situação provoca. Além disso, Naomi utiliza o silêncio e a pausa de forma eficaz, criando momentos de tensão que permitem ao espectador absorver a gravidade da situação. Essa entrega genuína transforma sua atuação em um dos pontos altos do filme, tornando-a memorável e impactante, enquanto sua vulnerabilidade ressoa profundamente com o público.


Sorria 2 se destaca pela expansão inteligente dos temas de seu antecessor, misturando terror sobrenatural com uma crítica afiada à cultura da fama e às pressões psicológicas que acompanham o estrelato. A nova abordagem adiciona uma camada de profundidade à narrativa, ao explorar como o horror se manifesta em um contexto de celebridade, trazendo novos elementos que enriquecem a trama. Ao fazer essa transição, o filme não apenas mantém o suspense e o terror psicológico, mas também amplia a discussão sobre os impactos da fama na saúde mental. Dessa forma, consegue superar seu antecessor ao combinar sustos eficazes com uma crítica social relevante e atual.


Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator em formação e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

MARIAS - Documentário que se aprofunda em apenas uma MARIA

Marias | Descoloniza Filmes


O documentário “Marias”, dirigido por Ludmila Curi, estreou em outubro de 2024. O filme é um "road movie" que viaja pelo Brasil e pela Rússia, destacando a vida de Maria Prestes, uma importante ativista nordestina que foi companheira do líder comunista Luís Carlos Prestes. Maria se engajou na luta pela reforma agrária e passou 40 anos ao lado de Luís Carlos, criando uma família e vivendo em exílio em Moscou. A obra, além de retratar sua trajetória, celebra outras figuras femininas que também marcaram a história, como Maria Bonita, Dilma Rousseff, Olga Benário e Marielle Franco.

O filme, por mais que se autointitule “Marias”, não se aprofunda, além da figura de Maria Prestes, como nas outras mulheres brasileiras: Dilma Rousseff, Olga Benário e Marielle Franco. Esta última, mesmo tendo tanta relevância nos últimos anos, é citada apenas nos minutos finais do documentário, como se fosse um recorte adicionado de última hora, limitado a um tempo de reportagem que provavelmente já assistimos no "Fantástico" da Rede Globo.

No que diz respeito à persona de Maria Prestes, o documentário consegue cumprir seu papel, retratando suas vivências desde a infância até o relacionamento com o famoso líder revolucionário Luís Carlos Prestes. A narradora consegue entrevistar Maria e, ao mesmo tempo, nos transportar a partir de manchetes e notas de jornais da época para nos localizar historicamente. Desde jovem, Maria já era ligada a pautas comunistas devido ao seu pai, João Rodrigues Sobral (conhecido como “Camarada Lima”).

Mas em nenhum momento o documentário sugere que Maria foi influenciada por seus familiares e marido em seus ideais políticos. Pelo contrário, ele reforça e afirma a autonomia que essa grande mulher pernambucana teve em suas atitudes e ativismo no decorrer de sua vida. Inclusive, em um trecho, o documentário faz questão de relatar um momento de conflito que ela teve durante atos de protestos e, mesmo assim, teve a certeza de continuar em sua luta política.

Através da entrevista com Mariana Prestes em 2017, filha de Maria Prestes (quando ambas moravam no interior do Piauí), podemos descobrir sobre a rotina da família durante o primeiro exílio de Luís Carlos Prestes. Mariana conta sobre as dificuldades que sofreram na época em sua infância, ela e mais oito irmãos (dois deles do primeiro casamento de Maria com Antônio Andrade).

Sua casa era constantemente vigiada devido à relação da mãe com um comunista exilado e, por isso, eles não tinham uma liberdade total para trafegar nas ruas e até mesmo adentrar em alguns terrenos que eram vigiados pelo governo. Isso demonstra como os filhos de Maria também foram afetados pelas perseguições políticas que seus pais sofreram e tiveram que se adaptar à realidade familiar. Apesar disso, Mariana soube contar momentos cômicos de sua vida jovem,mostrando que isso não prejudicou sua infância e que conseguia, mesmo nessa realidade, se divertir com seus irmãos como qualquer outra família.

Durante o segundo exílio de Luís Carlos Prestes, quando aconteceu a temida ditadura militar na Era Vargas, Maria teve que novamente se adequar a outra realidade, tendo que se exilar com seus nove filhos e seu marido na antiga União Soviética (URSS), onde passou nove anos de sua vida até receber a anistia brasileira e poder retornar ao seu país. Isso demonstra ainda mais a capacidade de resiliência dessa mulher, esposa e mãe que precisou fazer o que era melhor para sua família e se ambientar em uma língua e cultura totalmente diferente da sua.

A história de Maria é um espelho da sociedade brasileira. Quando percebemos o relato de Mariana, logo é possível notar a ausência do pai por questões de perseguições que vivenciava no período. A mesma diz, em um momento da entrevista, que não teve muito contato com ele, mas que o respeitava muito. Isso não exclui o fato de que tanto Mariana quanto seus irmãos tiveram um genitor ausente em sua família e que Maria Prestes foi uma mãe solo e uma mulher guerreira que teve que educar e sustentar nove filhos, passando por diversas adversidades ao mesmo tempo.

A falta da presença física de Maria no documentário durante as conversas não prejudicou sua história, só reforçou e deu mais visibilidade à sua trajetória –uma visibilidade que, muitas vezes, não é contada, retratada, ouvida de mulheres importantes no âmbito histórico brasileiro. Altamira Rodrigues Sobral Prestes (Maria Prestes) foi um símbolo de determinação nacional. Ela é só mais uma entre milhares de outras “Marias” nesse Brasil que passaram também pelas mesmas dificuldades e conseguiram ser resistentes perante as divergências da vida.

Isso me fez lembrar da minha mãe, também chamada Maria, e que também nasceu no Nordeste e foi mãe solo, precisando cuidar de quatro filhos e, ao mesmo tempo, trabalhar para arcar com as despesas de casa. Histórias como essas existem várias em nosso cotidiano, e cabe à sociedade desmitificar estereótipos de gênero, pois além das mulheres serem mães, esposas e profissionais, todas elas carregam a mesma humanidade, inseguranças e incertezas da vida que todos possuem.

“Marias” é um bom documentário no que tange à narração da vida de Maria Prestes, mas peca ao escolher o seu título e ao querer citar outras mulheres revolucionárias no espectro da esquerda política, pois não tem a mesma profundidade histórica desenvolvida como a de Maria Prestes. Todas elas foram grandes símbolos de ativismo político brasileiro, e não há como disponibilizar um tempo de tela para uma e apenas pincelar de forma rasa outras identidades tão influentes quanto foram para o país.



Autor:

Meu chamo Leonardo Veloso, sou formado em Administração, mas tenho paixão pelo cinema, a música e o audiovisual. Amante de filmes coming-of-age e distopias. Nas horas vagas sou tecladista. Me dedico à exploração de novas formas de expressão artística. Espero um dia transformar essa paixão em carreira, sempre buscando me aperfeiçoar em diferentes campos criativos.


terça-feira, 15 de outubro de 2024

Salão de Baile - Rio de Janeiro's Burning

Salão de Baile | Couro de Rato

Salão de Baile conta a trajetória do movimento Ballroom que nasceu nos Estados Unidos nos anos 1960, e que acabou chegando no Brasil nos anos 2000 (se tornando popular a partir de 2015). O movimento consiste em ser um espaço de liberdade de expressão Queer e LGBTQIA+ para poderem fazer performances de dança entre outras se baseando em artistas da música pop e nas poses e estéticas que se encontravam na Revista Vogue. O filme conta como esse movimento se encontra hoje no Rio de Janeiro. 

A direção em nenhum momento foge de mostrar sua inspiração pelo filme Paris is Burning da Jennie Livingston, lançado em 1990, que conta a mesma narrativa, porém em Nova York. Sem contar, claramente, que Nova York foi o berço do movimento Ballroom e a obra foi executada nos anos 90, onde a homofobia e a descriminação eram muito mais presentes do que os dias atuais. Mas isso seria um problema? Não, até pelo fato de que a direção utiliza tal obra simplesmente como inspiração, mas não a utiliza como uma bengala para o filme funcionar. 

Até porque a obra mostra esse cenário dentro da cidade do Rio de Janeiro, oque já é um ponto que traz muita diferença com a obra estrangeira citada, e o longo tempo de diferença de 40 anos até chegar ao nosso país. A obra mostra a ideia do Ballroom como uma resistência de existência e artística de todo um grupo marginalizado, entrevistando uma por uma das personagens contando suas realidades e como chegaram àquele espaço no qual elas encontravam liberdade. 

O filme também tem um foco na resistência afro no Rio de Janeiro, que vai no quesito estético, até mesmo na movimentação de seu corpo em suas performances. Mesmo o filme apontando os vários tipos de resistências presentes dentro do Ballroom, esses tópicos não colocam de lado a Ballroom que é o foco narrativo proposto. Mas, ao contrário, complementa ainda mais esse tema dentro do cenário carioca. 

A direção utiliza de várias linguagens para ligar a proposta do Ballroom com um espetáculo televisivo dos anos 90. Utilizando elementos estéticos, humor e os depoimentos de cada uma das personagens presentes para contextualizar o movimento e também fazer o espectador imergir para essa realidade tão pouco falada no cotidiano. A direção consegue de forma contundente misturar a explicação do que é o Ballroom, a vida de cada uma das participantes do movimento e o Ballroom que é mostrado durante o filme. Não só as performances chamam bastante a atenção do público, mas o como elas se conectam as suas personagens. 

A obra aponta questões como homofobia e o abandono familiar por conta da sexualidade, mas nunca coloca esses pontos em foco na obra, pois o filme prefere mostrar suas personagens quase como modelos da Vogue, e não transformar a imagem delas como apenas um grupo de vítimas da sociedade. Oque a obra consegue fazer de forma bem sucedida. 

Um dos poucos problemas que se encontra na condução desse filme, é perto da sua conclusão, onde os personagens começam a explicar sobre questões de gênero ao espectador. Isso destoa por completo do que era proposto. Não que falar sobre o tópico seja um problema, é necessário até por conta da conexão intrínseca com a origem do Ballroom, mas acaba sendo meia hora de didática escolar para o espectador. Oque se torna algo decepcionante, pelo fato da obra ser um grande espetáculo em conjunto com as vidas daquelas personagens que estão ali participando. 

É quase como se o filme olhasse para o espectador e o tratasse com pena em não entender alguns pontos ligados ao mundo LGBTQIA+ dentro do Ballroom, isso quebra a ligação do espectador com o espetáculo proposto. Mesmo isso sendo uma grande problemática, não afeta o total da obra, que continua tendo performances marcantes, como também mostra um cenário de expressão que muitos não conhecem, ou fingem não ver.

Salão de Baile consegue elaborar de forma clara oque significa a Ballroom no Rio, e aquelas que fazem parte dela. Tendo uma direção que consegue conectar uma montagem inteligente com o espetáculo filmado e mostrando a expressão daqueles que a todo tempo são marginalizados. Mesmo o filme perdendo sua força em alguns momentos, e não acreditando na capacidade de entendimento de seu espectador, o filme segue sendo uma porta para um lugar onde algumas pessoas conseguem encontrar liberdade finalmente. 

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

Ainda não é Amanhã - "Se os Homens engravidassem, seria possível fazer aborto no Caixa Eletrônico."

Ainda não é Amanhã | Espreita Filmes

O primeiro longa metragem da diretora Milena Times conta a história de uma jovem estudante de direito que acaba engravidando acidentalmente. Janaína, nossa protagonista, está decidida em realizar um aborto, mas no Brasil é considerado crime, obrigando Janaína a fazer oque puder para acabar com essa gravidez. A atriz Mayara Santos recebeu o prêmio de melhor atriz no Festival do Rio 2024.

A obra começa sendo direta mostrando Janaína indo até a faculdade no ônibus, com uma mulher sentada à sua frente carregando o próprio filho. Simbolizando que Janaína já carrega um feto em seu ventre, mesmo sem ela perceber. E isso se conecta com a primeira sequência do filme onde Janaína e sue namorado vão ter um ato sexual e todo o caminho até o ato é moldado no "silêncio", que é o estado da personagem durante a narrativa. 

Quando Janaína descobre sua gravidez, o trabalho da atriz consegue fazer o espectador sentir a angústia que a mesma sofre ao longo do filme todo. Prevalece na atmosfera da obra um incômodo de aquele problema não ser resolvido de forma segura. Para a protagonista, não existe a opção clínica de aborto, até pelo fato de que ela faz parte de uma família com baixa renda, não sendo possível pagar uma clínica segura. 

E em torno desse tormento de Janaína em saber que está grávida, o resto de seus compromissos continuam acontecendo sem ela poder fazer nada e sendo atrapalhada pela pressão e pela a angústia da gravidez. Podendo trazer consequências à sua bolsa de estudos, sua monitoria e na relação com sua família, que não sabe que ela está grávida. 

O leitor pode se lembrar de um filme, de 2019, que conta uma narrativa parecida, o filme "Nunca, Raramente, às Vezes, Sempre" da diretora Eliza Hittman, mas aqui a obra acontece com uma menor necessidade de mostrar problemas em volta do mundo feminino ligados ao aborto. O principal foco narrativo é a tensão de uma adolescente conseguir fazer um aborto sem sua família perceber, e isso sendo em um cenário brasileiro, na cidade de Pernambuco. 

É uma obra que tenta mais se conecta ao realismo da situação do que colocar o sofrimento dessa situação em holofote. Não existe a ideia de colocar o sofrimento em um pedestal para se apreciar a obra de forma apelativa, mas uma tensão que certa parcela do povo sabe o quão difícil é ter que fazer um aborto em um país que não é permitido e que os métodos são dificílimos de conseguir. Diferente do outro filme citado que é um sintoma do cinema Norte Americano em necessitar construir uma atmosfera pessimista a toda volta da protagonista, aqui é o oposto. 

O filme não conta com tamanhas pirotecnias técnicas, mas consegue dar espaço para a personagem desenvolver sua angústia a cada momento que passa. É necessário dizer que o filme executa o tema com o tempo que realmente precisa, a direção não se perde em elaborar os outros personagens. Além da Mãe que consegue ser um dos pontos que faz a obra ser finalizada de forma consistente

Diferente do filme Kasa Branca de Luciano Vidigal, que também fez parte do Festival do Rio de 2024, o filme em nenhum momento utiliza o elemento de humor que é costumeiro do cinema brasileiro atual, nem mesmo nos diálogos. Existe um cansaço explícito em todos ali presentes, principalmente na Avó e na Mãe da protagonista. E esse peso aumenta quando a protagonista fala "quando eu ganhar meu dinheiro, você pode finalmente se aposentar, e viver da costura que é oque você gosta." e logo depois descobre sua gravidez. 

É quase como se a obra fosse um desabafo de um mundo onde não se tem tempo para sonhar, mas que concluí com uma resposta otimista de forma que não destoa de todo o tom proposto pelo filme. Ainda não é Amanhã segue uma linguagem quase hiper-realista sobre as dificuldades de ser uma mulher com uma gravidez indesejada no cenário brasileiro sem necessitar abranger a discussão para os outros demônios que fazem parte desse resultado final, mas que foca na angústia intrapessoal da protagonista que não sabe que caminho tomar e nem se terá o apoio de quem ela mais ama.  

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

 

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Inverno em Paris - Luto e Autodescoberta

Inverno em Paris | Pandora Filmes

Lucas, de 17 anos, está no último ano de internato quando a morte súbita de seu pai destrói tudo o que ele tinha como garantido. Cheio de raiva e desespero, ele visita seu irmão mais velho em Paris para buscar consolo na nova cidade.

O luto se torna um elemento central na jornada emocional de Lucas, um adolescente cuja vida se desestabiliza após a morte súbita de seu pai. Essa tragédia não apenas desencadeia uma crise, mas também reflete as expectativas sociais e familiares sobre o que significa o luto, evidenciando a pressão que os jovens enfrentam para se conformar a normas de comportamento em momentos de dor. Em busca de apoio, Lucas viaja para Paris, onde seu irmão mais velho vive, numa escolha que revela tanto sua vulnerabilidade quanto sua busca por autonomia.

A viagem, embora possa ser vista como uma fuga, se transforma em uma complexa jornada de autodescoberta, enquanto lida com sentimentos de raiva e desespero. A morte do pai catalisa sua crise, ressaltando a profundidade e a complexidade do luto e suas diversas dimensões. O diretor Christophe Honoré, ao explorar a fragilidade de Lucas, provoca uma reflexão sobre a forma como a sociedade lida com a dor e o amadurecimento.

Através dos olhos de Lucas, somos confrontados com as expectativas distorcidas sobre a masculinidade e a pressão para ocultar vulnerabilidades. Assim, Lucas não enfrenta apenas a dor da perda, mas também os desafios de se encontrar em meio a emoções conflitantes, revelando a necessidade de um espaço seguro para o luto, que muitas vezes é negado aos jovens. O filme, portanto, se torna uma crítica à maneira como lidamos com o sofrimento, questionando as normas que muitas vezes silenciaram a expressão emocional genuína.

O ambiente parisiense, frequentemente romantizado como um espaço de liberdade e reinvenção, é apresentado de forma contida no filme. Embora a trama faça referências a vários locais icônicos, a maior parte da narrativa se desenrola em ambientes mais fechados, como o internato em outra cidade, a casa da família no interior e o apartamento do irmão. Essa escolha visual ressalta o crescimento pessoal de Lucas, já que, mesmo em meio a diálogos que mencionam lugares para visitar, o foco permanece em sua jornada interna. Assim, o que poderia ser um pano de fundo vibrante de Paris se transforma em uma representação mais íntima das lutas e descobertas do protagonista.


O filme é fundamentado em uma narrativa em primeira pessoa intermitente do próprio Lucas, que se apresenta ocasionalmente em um formato de entrevista contra um fundo preto. Essa escolha estilística funciona como um relato que não é completamente confiável em relação às suas próprias emoções, o que levanta questões sobre a autenticidade de sua experiência. Essa instabilidade na voz narrativa pode ser vista como uma reflexão sobre a complexidade do luto e a dificuldade de processar sentimentos profundos, mas também pode gerar uma distância emocional do espectador. Ao tornar Lucas um testemunho volátil de suas próprias vivências, o filme corre o risco de diluir a conexão empática que poderia ser estabelecida, deixando o público a questionar a veracidade de sua dor e, por extensão, a profundidade do tema que tenta explorar.


Inverno em Paris se destaca como uma exploração sensível e complexa do luto e da jornada de autodescoberta de um adolescente em meio à dor. A narrativa intermitente e a apresentação contida dos cenários parisienses ressaltam a luta interna de Lucas, evidenciando como as pressões sociais moldam a experiência do sofrimento. Assim, o filme não apenas retrata a dor da perda, mas também questiona a forma como a sociedade aborda o sofrimento, configurando-se como uma crítica contundente à repressão emocional que frequentemente acompanha a adolescência. Essa obra nos convida a refletir sobre a importância de acolher e validar as emoções dos jovens, promovendo um espaço de compreensão e apoio em momentos de vulnerabilidade.


Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator em formação e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Anora - Trabalhadoras do Sexo podem sonhar?

Anora | Universal Pictures

O novo filme de Sean Baker conta a jornada de uma dançarina erótica chamada Anora, que prefere ser chamada de Ani, e se envolve de forma amorosa com um cliente um pouco mais jovem e que faz parte de uma família de magnatas russos. Porém a vida de Anora vira de cabeça para baixo quando aqueles que tomam conta do jovem russo descobrem que o mesmo casou com uma dançarina erótica(que chamam de prostituta e entre outras palavras menosprezando ela) e fazem de tudo para divorciar o casal recém casado. 

O filme em sua introdução não tenta colocar a protagonista como uma trabalhadora que sofre a todo tempo com o trabalho que tem e que demoniza o mundo da prostituição como muitos outros filmes norte americanos gostam de construir na maioria das narrativas audiovisuais, é simplesmente Anora fazendo seu trabalho e vivendo seu dia a dia como qualquer trabalhadora em seu cotidiano. Sean Baker sempre propôs fazer filmes onde foca mais na humanidade de seus personagens do que o quão o mundo exterior é capaz de fazer mal ao indivíduo. 

No caso desta obra, o desenrolar da narrativa é Anora não tentando manter um casamento pelo ponto financeiro com que estava, mas realmente por acreditar que alguém a amava mesmo trabalhando no mundo erótico. Sean Baker nos propõe isso na primeira parte do filme, e muda o cenário em um estalar de dedos. No momento em que os comparsas de Toro, o responsável pelo jovem russo, entram em sua casa e começam a buscar uma solução para o fim desse casamento, começa a construção atmosférica da fotografia com a ansiedade provocada pelos personagens, resultando em uma nova proposta ao espectador.

O espectador se quebra em perceber que talvez a jornada que Anora entrou pode resultar em algo muito mais complexo do que o proposto. Não é uma história de amor no final das contas, mas uma história de controle. Anora não tem controle sobre nada enquanto a história acontece, tudo é uma questão de dinheiro e poder para aqueles que estão à sua volta. E qualquer sinal de humanidade aparente dentro daquele mundo, Anora trata com desdém, vide o personagem Igor que facilita Anora mostrar essa faceta. 

O filme utiliza a falta de trilha sonora e a falta de cores na fotografia para ter um contato mais realistico com oque está acontecendo ali, mas não coloca o mesmo realismo nos diálogos, onde se concentra a maior carga de humor negro e caricato entre os personagens. Sean Baker falha em abordar o tema "estupro" nos diálogos, que tentam ser utilizados como uma piada, mas que na segunda vez proposta fica algo deslocado e sem necessidade. O humor aqui funciona mais pelo surrealismo de como as coisas acontecem do que como as coisas são faladas. 

A atriz Mikey Madison além de ter uma forte presença em tela, consegue ter um desenvolvimento maduro e bem executado ao longo da narrativa. Os atores Karren Karagulian, Vache Tovmasyan e Yuri Borisov conseguem ser os melhores elementos cômicos do filme com seu tempo em tela e fazendo plena com o desenvolvimento da protagonista até a conclusão da obra. Anora é o retrato de como o mundo vê e trata as mulheres que trabalham no mundo erótico, mas em nenhum momento as colocando como vítimas do mundo, e sim de poder viver uma vida normal sem as colocarem como só um entretenimento. A dura vida de mulheres que não são vistas como humanas. 

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

Os Enforcados - Se o Jogo do Bicho fosse uma tragédia de Shakespeare

Os Enforcados | Globo Filmes

Os Enforcados conta a história de um casal, estrelados por Leandra Leal e Irandhir Santos, que está afogado em dívidas e precisam dar um jeito para não perderem toda a casa de luxo que já estava em construção. Para isso, o casal começa a utilizar métodos perigosos que os vão afundando cada vez mais e perdendo a confiança de todos aqueles que estão ao seu lado, sendo os melhores amigos ou os parentes. A direção é de Fernando Coimbra, responsável pelo filme "O Lobo Atrás da Porta".

Necessário enfatizar que a obra não funcionária sem o trabalho de atuação de Leandra Leal e Irandhir Santos, ambos conseguem entregar ainda mais potência à imagem do que a direção de Coimbra já entrega. Mesmo o filme sendo uma releitura de obras como Hamlet e Macbeth, em nenhum momento o filme cai para o lado teatral como muitas vezes acontece quando se aborda elementos vindos de sua origem. Regina, personagem de Leandra Leal, tem um desenvolvimento de personagem em conjunto com todo o resto da obra quase como uma incrível maestra do caos, fazendo o espectador em nenhum momento tendo tempo de respirar e tirar os olhos da tela. 

Além de que Coimbra utiliza a casa dos protagonistas como um personagem a parte. A casa até certo ponto do filme fica parada em sua construção, com as afiações instaladas só até algumas partes e a infiltração nas paredes que são elementos pontuais, elementos que fazem parte do crescer da paranoia de Regina do início ao fim do filme. Até mesmo quando a casa fica completamente pronta, da mesma forma que Regina via em uma revista, entramos na mesma paranoia de Regina em notar que em um local tão limpo, esteja tão lotado de sujeira. 

Os enquadramentos do filme se conectam plenamente com cada sequência na obra, capturando o casal conversando entre uma parede ainda em reforma, pegando eles tomando um rumo para cada corredor em uma mansão imensa, ou até mesmo depois de um tiroteio e Regina fugindo de seu carro com a câmera a capturando pelo canto da janela, quase como o plano de John Wayne saindo pela porta em Rastros de Ódio de John Ford. 

A construção do suspense também consegue atingir seu apogeu com o jogo de desconfiança entre o casal, terminando com o mais puro suco de violência que tem um pouco de referência de Trono Sujo de Sangue do Akira Kurosawa. Onde a única saída que se encontra para tudo aquilo que está entregue em uma sala de estar é a completa aniquilação. Onde nem mesmo o ser mais inocente de todo aquele ambiente consegue fugir do que está por vir.  

Os Enforcados é uma tragédia de Shakespeare no Rio de Janeiro, com interpretações potentes e que fazem parte de uma direção tão forte quanto. Com a mistura de suspense, humor e violência, a obra consegue colocar o espectador em êxtase e querendo sentir mais mesmo o filme entregando tudo aquilo que o espectador está a procura na sala de cinema: Um caos pulsante.  

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

terça-feira, 8 de outubro de 2024

Kasa Branca - Rio de Janeiro além do Cartão Postal

Kasa Branca | Globo Filmes

Kasa Branca conta a história de Dé, um jovem da periferia do Rio de Janeiro que toma conta de sua avó, que sofre de Alzheimer terminal. Dé consegue tomar conta de sua avó com apoio de seus dois melhores amigos passando por várias dificuldades, além dos conflitos de cada um deles com suas próprias vidas. O filme é dirigido pelo conhecido ator Luciano Vidigal e tem como protagonista o ator e comediante Big Jaum, Teca Pereira interpreta a avó de Dé.

O filme mostra um cenário de dificuldade que muitos jovens negros vindos da periferia passam pelo Rio de Janeiro sem ser de forma apelativa. Mostra de forma bem explicita os problemas financeiros que muitos jovens passam por tomar conta de seus ente queridos e tentando dar seu máximo para conseguir sobreviver o mínimo com o apoio daqueles que estão ao seu lado. Mesmo o filme mostrando um cenário bastante drástico, não é um filme que coloca o sofrimento como foco, mas a vida além do sofrimento que já não tem mais solução.

Seus amigos, que o ajudam a tomar conta de sua avó, fazem Dé viver muitas experiências no filme que são a principal corda condutora no quesito cômico, sendo piadas e as formas de falar que a maioria só vai entender sendo um bom carioca da gema. Isso torna todo aquele cenário mais humano, sem tentar focar a vida na comunidade com algo apenas sofrível e pesado como é desenhado muitas vezes no cinema brasileiro. 

Luciano Vidigal faz questão de apontar o foco do filme sendo as relações humanas, oque faz o espectador se sentir abraçado por aquele cenário sem parecer um turista de um espaço que muitos evitam em enxergar humanidade, algo que para quem conhece a visão dos moradores da Zona Sul do Rio de Janeiro sobre as comunidades sabe que existe e acontece. Dé carrega a dificuldade de cuidar de sua avó em seu estágio terminal de Alzheimer, mas isso não o deixa isento de sentir amor, de curtir uma festa, de sair com seus amigos. Existe uma vida ali, e ela é bela.

Sem contar o trabalho de desenvolvimento de seus dois amigos, Martins e Adrianim. Martins é o personagem que é o principal elemento no ponto cômico da obra, vivendo a vida como se não tivesse amanha, e Adrianim sendo um amigo que sofre por um amor que não sabe se existe reparo ou não. O desenvolvimento de ambos os personagens e oque acontece na sua vida em paralelo além de ajudar Dé é feito de forma bastante orgânica e sem nenhum momento perder o tom. 

Luciano consegue conduzir de forma madura e direta a proposta do filme que em nenhum momento se perde, além de ter uma conclusão potente para a jornada dos três personagens. Fazendo o espectador se sentido abraçado pelos personagens e querendo abraçar os mesmos. No quesito técnico, o filme não tenta ir muito além do básico, até mesmo quando se fala de enquadramentos e em pontos estéticos como direção de arte e figurino. É um filme que tem uma proposta de argumento muito bem feita por conta do roteiro e da atuação, mas o resto do filme não casa com oque é proposto por todo o resto. 

Mesmo o ponto técnico sendo apenas funcional, a obra em seu conjunto geral consegue ser finalizada de forma madura e com uma beleza em sua simplicidade no que é entregue ao espectador. Kasa Branca é um drama e uma comédia que consegue exalar um puro sentimento do que significa ser carioca. 

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

terça-feira, 1 de outubro de 2024

Coringa: Delírio a Dois - O Palhaço se afogando em sua própria loucura

Coringa: Delírio a Dois | WarnerBros. Pictures


Coringa: Delírio a Dois é a continuação do primeiro filme, lançado em 2019, contando a história de Arthur Fleck. Um comediante frustrado e que passou por uma sequência de abusos psicológicos e sexuais por sua mãe e ex companheiros, até o momento em que ele perde a cabeça e se transforma no símbolo do caos da cidade de Gotham. No segundo filme, conta a continuação de sua história 2 anos depois dos acontecimentos, tendo agora a personagem Lee, interpretada por Lady Gaga, que se torna sua parceira em suas loucuras enquanto acontece seu julgamento. 

O filme não tenta se distanciar esteticamente do primeiro filme, mesmo com as cenas musicais, a direção não tenta se desvincular completamente do que foi proposto na primeira obra. É necessário confirmar que o filme é realmente um musical, e essa escolha de narrativa em certos momentos faz certas conexões plausíveis a ver com o protagonista e todo seu contexto envolta. Porém, o filme se perde bastante em tentar desenvolver o protagonista que já conhecemos do primeiro filme.

Enquanto o primeiro filme faz uma conexão direta à clássicos como "Taxi Driver" e "O Rei da Comédia", ambos do diretor Martin Scorsese, o segundo continua com essa conexão no sentido estético, mas também se baseia no cinema americano musical dos anos 50 e 60, misturando com drama de tribunal. O resultado é como se Todd Phillips estivesse tentando se provar como um bom diretor em todas essas linguagens. Mas o espectador não está interessado em saber do que o diretor é capaz, e sim sobre oque vai ser do palhaço que começou o caos pulsante em Gotham. 

Joaquin Phoenix continua mostrando um bom trabalho, mas fica parado no mesmo Arthur Fleck do primeiro filme, seu desenvolvimento aqui se mostra pífio e sem caminhar para lugar algum. Enquanto Lee, interpretada pela Lady Gaga, é um dos pontos mais chamativos do filme. Não só pelo seu talento como cantora, mas sendo uma Arlequina diferente da proposta de ser uma figura como a das antigas animações e história em quadrinhos que mostram ela completamente obcecada e escrava do Coringa. Temos uma figura aqui tão caótica quanto o próprio Arthur Fleck e os outros coringas já mostrados em outros filmes. 

O filme tem muito menos violência do que o primeiro, pois Todd Phillips faz questão em mostrar que está mais interessado em dirigir os pensamentos do Coringa do que realmente acontece envolta dele. E a trilha sonora consegue se manter da mesma qualidade do primeiro filme, fazendo o espectador desejar muito mais ouvir a trilha de Hildur Guonadóttir do que os musicais propostos ao longo da narrativa. 

É necessário apontar o quão o primeiro filme faz críticas árduas sobre a falta de estrutura e investimento nas áreas ligadas à saúde mental nas grandes metrópoles, e como o segundo filme deixa isso completamente de lado. A potência do primeiro filme também era a de mostrar como o submundo dos Estados Unidos pode ser uma imensa fábrica de caos que se mantém quieta até um mártir aparecer. O segundo filme elabora isso apenas em seus últimos minutos, e de forma completamente desinteressada pela direção executada.  

Coringa: Delírio a Dois é uma continuação que se perde na própria loucura de Arthur Fleck, onde poderia ter adicionado muito mais camadas à história do rei do caos de Gotham, mas acaba sendo uma obra que não complementa oque foi apresentado no primeiro filme e coloca nosso protagonista de escanteio de uma forma amadora e desleixada. 

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

segunda-feira, 23 de setembro de 2024

O Dia que te Conheci - Se vende como Comédia, mas é só um Drama convencional

 

O Dia que te Conheci | Filmes de Plástico

O Dia que Te Conheci começa mostrando Zeca pedindo repetidas vezes para seu colega que o acorde de qualquer jeito no dia seguinte às 06:20 da manhã para que possa chegar no trabalho a tempo. Porém, mesmo o colega o tentando acordar, Zeca se recusa a levantar e mais uma vez chega ao trabalho atrasado. Ao chegar em seu trabalho, ele recebe um aviso de sua colega de trabalho, Luísa, de que ele foi demitido. Zeca e Luísa voltam juntos de carro para a mesma direção e começa então uma nova história de amor. 

O filme não tenta se mostrar algo muito diferente do que se propõe sendo composto majoritariamente por planos parados, sendo eles conjuntos ou gerais, e com uma trilha sonora que invade por bastante tempo a narrativa. O mais incômodo é o filme tentar se vender com uma atmosfera de comédia romântica norte-americana, tendo uma trilha sonora exagerada e com soluções baratas de roteiro para a narrativa acontecer. 

A obra mesmo sendo feita na forma mais básica possível, sendo na direção e na composição geral da obra, ainda consegue entregar certos pontos que tornam o filme sustentável, sendo no caminho do drama com os diálogos entre os personagens protagonistas. A conversa do casal sobre quais remédios cada um usa, e como é a vida deles no dia a dia mostra a triste realidade que vivem as pessoas no cotidiano, além de ser o principal tópico de conversa entre eles. 

Não atoa o dialogo entre eles em boa parte do filme é só isso, e o ápice do encontro é uma tentativa de fazer algo engraçado e que não fica engraçado por conta da forma que é conduzida e pela atuação do Renato Novaes como Zeca. Sua atuação é operante em meio a uma narrativa que também não exige muito de um personagem que é só um cara atrapalhado. 

O Dia que Te Conheci tenta ser um abraço acolhedor para os amantes de comédias românticas e tenta ser crítico em seus diálogos pouco expressivos, além de ter uma certa aleatoriedade nos diálogos para tentar causar um certo humor que não funciona. Se embaralha dentro de sua própria proposta e não consegue funcionar nem no quesito narrativo, quanto mais no quesito técnico. Não precisava de muito, mas também não se contenta com tão pouco. Ainda sim, consegue ser suportável pela atmosfera aconchegante e com certos diálogos mais orgânicos quando bem aplicados. 

TEXTO DE ADRIANO JABBOUR.

Sting: Aranha Assassina - Quando o Terror Se Perde em Tentativas de Humor e Drama Familiar

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