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segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Labirinto dos Meninos Perdidos (2025) - O lugar para se perder e se reencontrar

O Labirinto dos Meninos Perdidos (2025) | Filmicca

 

No imaginário popular, São Paulo é a máquina de moer gente, um labirinto que a cada esquina pode dar um caminho ou num beco sem saída, com suas lendas e paranoias. Pessoas migram à metrópole para se perder e se reencontrar; mas crescer em um ambiente assim, às vezes, pode ser predatório e vulnerável. Para cada história de sucesso, há também suas tragédias. Um lugar real que não existe, cuja realidade está mais próxima dos sonhos e da psicanálise do que de algo concreto, palatável. É nesta contradição que Miguel se encontra. Ele é jovem e está na cidade para prestar um vestibular. Seu caminho cruza com diferentes personagens excêntricos em Labirinto dos Meninos Perdidos (2025), o novo lançamento do realizador queer independente Matheus Marchetti. 

Se a filmografia de Marchetti, até agora, se passa dentro de um olhar infantil do mundo, como em O Bosque dos Sonâmbulos (2016) e Verão Fantasma (2022), aqui ele está disposto a crescer um pouco para uma abordagem entre a adolescência e a vida adulta. Ele é um romântico macabro, com uma sensibilidade emocional apurada. Mesmo com um orçamento limitado, quase do próprio bolso, ele tem ideias ambiciosas. Ele é novo, mas tem a alma dos cineastas de décadas passadas, que fizeram cinema com muito pouco; abraçando com braços de mãe os triunfos e os defeitos de seus filmes (Quem for fã de giallo vai notar do que falo aqui). São obras que imprimem o teatral, o performático, o plástico, que flertam com o onírico e a recusa da realidade e sua lógica verossímil. (Inclusive boa parte de seu elenco vem do teatro paulistano) 

Aqui, sua São Paulo é não a personagem espacial que imaginamos. Marchetti explora algo muito mais íntimo e secreto: é uma casa mal assombrada, uma vizinhança erma, um museu ou um aquário vazio. A dimensão trabalhada pela direção é psíquica do que física, portanto, a cidade é vista mais como uma abstração do que uma representação real. (Apesar de terem filmado numa exposição de terror que foi bastante popular do MIS, na qual este crítico até compareceu em uma ocasião!!!)

Seus filmes são coloridos e possui uma forte influência estética do cinema europeu dos anos 60 e 70. Porém, aqui ele flerta com um gênero bastante brasileiro: a chanchada. As situações e a sequências de dates e ficadas em série lembram muito o absurdismo cômico das comédias eróticas produzidas pela boca nos anos 70. Quase se Superbad (2007) e After Hours (1985) tivesse um primo latino-americano viado, um pouco mais tímido e teatral, e com acesso às mansões das vizinhanças ricas paulistanas. Cheio de desejos e escabrosidades. com mais tara também. Marchetti sabe como filmar uma cena de sexo e causar as sensações apropriadas em seu público-alvo, sabendo explorar a dimensão dos corpos e do prazer que eles sentem. Eles suam, gemem, mijam e gozam.

Para além da comédia sexual, também há o aspecto do terror, exprimido na figura do aparente serial killer que assola os gays da cidade. No entanto, tal como o filme Cruising (1980), o filme trabalha com as implicações psicológicas e sociais da notícia do assassino á solta, do que focalizar em sua figura (como um favorito meu, Faca no Coração lançado em 2018). Todas as pulsões sexuais de Miguel e todos os dates podem levá-lo ao seu fim. A busca pelo gozo é a busca pelo assassino, que, por si, é uma abstração de um pensamento neurótico. 

Mas Matheus Marchetti não deixa de lado a alusão à monstruosidade em sua narrativa, que também almeja e precisa do gozo, a sensação de ser amado, de pertencimento. E o caminho de Miguel irá se cruzar com esse monstro, assim como Christine Daaé ouve o canto do Fantasma da Ópera pelas catacumbas de Paris. A São Paulo cosmopolita, com seus encantos frios e seus prazeres aleatórios, é a ruína em que Miguel deverá percorrer, juntos aos seus perigos, para achar a voz que clama por ele. Percorrer o labirinto em que jovens se perdem, se traem e se humilham para garantir seu posto. Em todos eles há um pouco de Dr. Jekyll e Sr. Hyde, prontos para saírem durante à noite, revelando seus amores e desejos sombrios. O amor moderno e a pegação por aplicativos nunca foram tão monstruosos quanto agora.

 *Este filme faz parte da seleção da 49a Mostra Internacional de São Paulo, realizada em 2025, visto em screener, cedido pela produção do projeto.

Autor:
                                  

Eduardo Cardoso é natural do Rio de Janeiro, Cidade Maravilhosa. Cardoso é graduado em Letras pela Universidade Federal Fluminense e mestre em Estudos de Linguagem na mesma instituição, ao investigar a relação entre a tragédia clássica com a filmografia de Yorgos Lanthimos. Também é escritor, tradutor e realizador queer. Durante a pandemia, trabalhou no projeto pessoal de tradução poética intitulado "Traduzindo Poesia Vozes Queer", com divulgação nas minhas redes sociais. E dirigiu, em 2025, seu primeiro curta-metragem, intitulado "atopos". Além disso, é viciado no letterboxd.

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