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O Agente Secreto | Vitrine Filmes |
Em 1977, um especialista em tecnologia foge de um passado misterioso e retorna à sua cidade natal, Recife, em busca de paz. Ele logo percebe que a cidade está longe de ser o refúgio que busca.
Com a vida constantemente ameaçada, cercado pela sombra da repressão e pela vigilância opressiva do regime, Marcelo luta para preservar não apenas a própria sobrevivência, mas também a dignidade. Em meio ao caos, seu maior desejo é garantir segurança ao filho pequeno, que vive sob os cuidados dos avós maternos — o avô, um projecionista silenciosamente resistente, mantem viva a arte e a memória coletiva no emblemático Cinema São Luiz. Em busca de respostas sobre a história fragmentada de sua família, especialmente a verdade sobre a situação civil de sua mãe falecida, Marcelo assume uma identidade falsa e passa a trabalhar num cartório — um espaço onde vidas são registradas, mas onde muitas também são apagadas pelo silêncio institucional.
Em sua jornada, ele encontra um respiro em um "aparelho" — um lar clandestino compartilhado com outros corpos e vozes excluídos pelo sistema: um casal angolano exilado, o velho e sábio Euclides, e Dona Sebastiana, mulher de força tranquila que se torna um porto afetivo e político. Esse convívio, entre traumas e solidariedades, revela que, mesmo na adversidade extrema, persiste o desejo coletivo por justiça, pertencimento e liberdade. Marcelo sonha em deixar o país, mas não foge — resiste. E, ao fazê-lo, sua trajetória revela as fissuras de uma nação marcada pelo autoritarismo, onde o amor, a memória e a esperança ainda insistem em brotar, mesmo sob a terra dura da repressão.
Dona Sebastiana é, sem dúvida, a personagem mais marcante do filme. Com sua língua afiada e um humor afetuosamente irreverente, ela cumpre o papel de alívio cômico — mas vai muito além disso. Representa um tipo humano tão genuíno e familiar que é quase impossível não se lembrar de alguém parecido que já cruzou nosso caminho. Sua presença em cena é magnética, equilibrando leveza e profundidade, e merecia, sem exagero, um Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. Dona Sebastiana é dessas figuras que ficam com a gente muito depois do fim da sessão.
O longa resgata a figura da perna cabeluda, lenda urbana profundamente enraizada no imaginário popular do Recife. Famosa lenda urbanda recifense dos anos 1970, como metáfora da repressão durante a ditadura militar. A cena que fala da lenda urbana faz uma homenagem aos filmes trash e slasher dos anos 80, trazendo um elemento de horror popular que conecta o folclore local a uma estética cult e de terror, reforçando o clima de medo e violência. Com sons tensos, minimalistas e uma batida hipnótica, a música cria uma sensação constante de suspense e ameaça iminente, reforçando a presença aterrorizante da criatura. Essa escolha sonora não só remete ao universo trash e de horror da época, mas também potencializa a metáfora da repressão e do medo que permeiam o filme, transformando a perna em um símbolo de terror coletivo.
O Agente Secreto combina memória histórica, folclore e suspense para retratar a repressão da ditadura militar de forma sensível e impactante. Com personagens fortes, o filme mostra como o medo e a resistência coexistem, deixando marcas profundas, mas também uma esperança persistente por liberdade.
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