segunda-feira, 21 de julho de 2025

Eu sei o que vocês fizeram no verão passado (2025) - Afiado, porém enferrujado

 

Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado (2025) | Sony Pictures

O cheiro da maresia, uma brisa suave, o som das ondas batendo nas rochas, os fogos de artifício explodindo no céu do quatro de julho… Não importa que seja em 1997 ou 2025, se você for jovem e dirigir pela estrada da cidadezinha de Southport é bem provável que cause a morte de um desconhecido e este mesmo indivíduo queira retribuir o favor com chantagem e sangue.

 Após o sucesso de Pânico (Scream, 1996), o roteirista Kevin Williamson apresentou para os executivos da Columbia Pictures a ideia de adaptar o livro infanto-juvenil de Lois Duncan sobre um dilema moral em uma nova franquia de slasher. Eis que surge a versão de 1997 do clássico terror teen Eu sei o que vocês fizeram no verão passado, em que quatro amigos são perseguidos por um stalker vestido de pescador sobre um crime que cometeram um ano antes e acobertam desde então.

Após uma recepção morna da crítica, o primeiro filme foi um sucesso de público e bilheteria. O estúdio lança uma continuação apressada no ano seguinte, Eu ainda sei o que vocês fizeram no verão passado (1998), que é detonada pela crítica e desagrada parte dos espectadores do longa anterior. A franquia entra em um limbo, nunca se concretizando como uma franquia longeva de sucesso, mesmo fazendo parte do imaginário pop dos anos 90. Houveram duas tentativas de ressuscitá-la: como uma continuação em um filme para Home Video em 2006 e como um reboot no formato de série, produzido por James Wan, para Amazon Prime Video em 2021. Ambas falharam.

Após o cancelamento da série de streaming, a diretora Jennifer Kaytin Robinson apresentou aos produtores da franquia sua ideia para revivê-la no cinema, bem no estilo do que ocorreu na franquia Pânico, sua concorrente, em 2022. Interessados no conceito, apesar do fracasso recente, anunciam a produção da nova versão da franquia, que a Sony lança mundialmente, em pleno verão estadunidense.

O longa-metragem de 2025 pega o ponto de partida do primeiro: após causarem um acidente de carro fatal, cinco  amigos (Madelyn Cline, Chase Sui Wonders, Jonah Hauer-King, Tyriq Withers, Sarah Pidgeon) prometem guardar segredo sobre a tragédia que causaram e seguir em frente com suas vidas. Mas, um ano depois, o passado volta para assombrá-los quando são perseguidos pela figura do pescador. Enquanto as autoridades ignoram que uma nova onda de assassinatos esteja acontecendo na cidade, os jovens vão atrás dos dois únicos sobreviventes do Massacre de Southport para conseguirem ajuda: Julie James (Jennifer Love Hewitt) e Ray Bronson (Freddie Prinze Jr.).

Robinson, que também corroteiriza esta versão, parece ter um carinho com o filme original, mas que, dentro da lógica do soft reboot, não consegue transparecer tão bem em tela. A sensação, durante o decorrer da narrativa, é que não se sabe até certo ponto quando o filme entra na homenagem de suas raízes ou no modo paródico. O tom do filme parece, a todo custo, ir de um ponto ao outro. Não é um problema exclusivo desta franquia, mas que se repete aqui.

Se a versão de 97 explora o imaginário das lendas urbanas, as tensões morais e psicológicas, classes sociais e o choque de realidade de suas personagens, a de 25 utiliza do fator nostalgia para fazer um comentário raso a fenômenos que vivemos desde a década passada: gentrificação, a ascensão do true crime, podcasters, o apagamento de histórias e traumas coletivos, a crítica aos ricos. São temas pertinentes, se fossem bem desenvolvidos. As questões morais e de classe aparecem, mas não por muito tempo.

O roteiro aqui tem sua sagacidade, mas é frágil. Ele emula a narrativa do primeiro filme, mas sem as suas nuances. Recorre a situações que aconteceram em versões anteriores. As personagens são arquétipos que servem, muitas das vezes, como reflexos geracionais, desconstruídos ou não, da primeira interação. A figura do pescador é mais agressiva, contudo, menos sociopata. Tem composições interessantes. As cenas das perseguições e mortes, no geral, são satisfatórias, mas não atmosféricas o suficiente para serem memoráveis. A tensão existe, mas é bem encurtada.

Apesar de Robinson tomar escolhas arriscadas no terceiro ato, o que é interessante, elas não se sustentam. A revelação do pescador? Poderia ser melhor. O que aconteceu exatamente entre Julie e Ray em duas décadas? Nunca saberemos. Muitas informações são jogadas sem uma corroboração que seja satisfatória, e outras sem o desenvolvimento apropriado.  É incerto definir se a trama faz um comentário sobre nostalgia ou se apropria puramente dela.

A direção é pautada na ironia, o que é, ao mesmo tempo, o diferencial e o erro do longa. Ela brinca com humor e a tensão durante sequências em que personagens estão correndo risco de vida (como edição paralela da cena do ataque de arpão cortando para outra personagem na banheira alheia ao ataque, por exemplo). Há um flerte com o camp, mas sem se comprometer em ser de fato (o que é um crime!), principalmente em uma cena envolvendo uma personagem icônica para alegria de muitos. Além disso, a carga dramática que foi essencial para o desenvolvimento da versão original é deixada de lado, o que esvazia a obra de alguma conexão genuína e humana. Sutilezas que poderiam elevar uma narrativa.

Mesmo com uma boa interação mútua do elenco, as personagens de Ava e Danica são as mais desenvolvidas na nova versão e suas intérpretes, Wonders e Cline respectivamente, fazem maravilhas com as limitações do roteiro: uma é a protagonista, a outra é o alívio cômico que rouba a cena. O mesmo não pode ser dito para as personagens de Hauer-King, Withers e Pidgeon, que não possibilitam os atores a saírem da caixinha.  A ponta de Gabbriette é divertida. É ótimo ver Hewitt e Prinze Jr. retornarem como Julie e Ray, mas, apesar de serem importantes à trama, seus papéis sofrem de uma escrita fraca, deixando-os deslocados em relação ao novo elenco.

É um filme divertido, sem “barrigas”, para ver com amigos, mas que ainda não encontrou a sua identidade própria. É um reboot ou uma paródia? É genuíno ou irônico? Quer ser cunty, mas sem a garra necessária? Tem alguns acertos, principalmente de elenco, porém é perdido na base de sua proposta, que é bem oca. O problema é o que virá a seguir: o final deixa pontas abertas para uma possível continuação, mas será que a versão de Robinson terá fôlego para carregar uma nova franquia nas costas? O gancho do pescador ainda está afiado, porém enferrujado. Funciona, mas precisa ser mais polido de vez em quando.

                                                                  Autor:
                                  

Eduardo Cardoso é natural do Rio de Janeiro, Cidade Maravilhosa. Cardoso é graduado em Letras pela Universidade Federal Fluminense e mestre em Estudos de Linguagem na mesma instituição, ao investigar a relação entre a tragédia clássica com a filmografia de Yorgos Lanthimos. Também é escritor, tradutor e realizador queer. Durante a pandemia, trabalhou no projeto pessoal de tradução poética intitulado "Traduzindo Poesia Vozes Queer", com divulgação nas minhas redes sociais. E dirigiu, em 2025, seu primeiro curta-metragem, intitulado "atopos". Além disso, é viciado no letterboxd.

sexta-feira, 11 de julho de 2025

Superman (2025) - Um Novo Horizonte Para o Universo DC

Super-Homem | Warner Bros. Pictures


O filme segue a jornada de Clark Kent/Superman para reconciliar sua herança kryptoniana com sua família humana adotiva em Smallville, Kansas.


Este é o primeiro filme oficialmente ambientado no novo universo cinematográfico da DC, marcando o início de uma nova fase após o polêmico universo anterior — iniciado em 2013 — ter chegado ao fim com Flash (2023) e Aquaman 2: O Reino Perdido. Diferente de O Homem de Aço (2013), que adotava uma atmosfera mais sombria e realista, este novo longa aposta em um tom mais leve, visualmente colorido e mais fiel ao estilo dos quadrinhos. O uniforme do Superman no novo filme é mais próximo dos quadrinhos clássicos, com o tradicional azul vibrante, o símbolo no peito mais arredondado e até a cueca vermelha por cima da calça. O visual em geral aposta em cores mais vivas e paletas que remetem aos gibis.


O filme opta por não recontar, mais uma vez, a história de origem do Superman — uma decisão inteligente, considerando que o público já está familiarizado com a trajetória do herói, seja por meio dos quadrinhos ou das várias adaptações anteriores para o cinema e a TV. Seguindo o mesmo caminho de produções como Batman (2022) e Homem-Aranha: De Volta ao Lar (2017), o longa apresenta um protagonista que já está estabelecido como super-herói desde o início da trama. Essa abordagem permite que a narrativa avance de forma mais dinâmica, focando no desenvolvimento do personagem em seu contexto atual, nas suas relações e nos desafios que enfrenta, ao invés de repetir eventos já bem conhecidos como a destruição de Krypton ou a descoberta de seus poderes na adolescência.

David Corenswet se mostra a escolha ideal para interpretar o Homem de Aço. Mais do que um “rosto bonito”, ele é um ator com alcance dramático, capaz de entregar nuances essenciais para um personagem como Superman — alguém que carrega a responsabilidade de salvar o mundo, mas também os dilemas internos de quem tenta viver entre humanos. Sua atuação equilibra com autenticidade as duas faces do herói: como Superman, é confiante, sereno e inspirador, transmitindo autoridade sem intimidação; como Clark Kent, é mais contido, com uma voz mais leve e postura tímida, revelando esforço genuíno em se passar por alguém comum. Essa variação vocal e corporal reforça a dualidade entre o símbolo e o homem — algo que muitos atores no passado deixaram de lado, mas que Corenswet domina com precisão. Mais do que força e poderes, seu Superman tem alma, humanidade e um senso de justiça verdadeiro. Ele entende que ser um herói é menos sobre ser invencível e mais sobre inspirar. Por trás da capa, sua interpretação revela um homem profundamente empático — e é essa verdade emocional que torna sua performance tão marcante.

Durante a trama, somos apresentados a outros heróis que compõem este novo universo da DC, ampliando a sensação de um mundo já habitado por figuras superpoderosas. Entre eles estão o Senhor Incrível , um gênio tático e tecnológico; Guy Gardner, um dos representantes da Tropa dos Lanternas Verdes, conhecido por sua personalidade explosiva e provocadora; e a Mulher-Gavião, uma guerreira feroz com raízes nas antigas civilizações e um forte senso de honra. A presença desses personagens não apenas enriquece o universo compartilhado, como também posiciona o Superman como parte de uma comunidade de heróis — algo muito comum nos quadrinhos, mas raramente explorado com profundidade nas adaptações anteriores. Ao invés de ser o único super-herói em destaque, ele já surge inserido em um mundo maior, repleto de aliados (e possivelmente rivais), o que abre caminho para futuros crossovers e uma construção mais orgânica do novo universo cinematográfico. 

O filme traz diversas cenas de comédia, marca registrada do diretor e roteirista James Gunn, conhecido por seu trabalho na trilogia Guardiões da Galáxia, Esquadrão Suicida (2021) e Pacificador. O humor de Gunn se destaca pela combinação de piadas rápidas, diálogos afiados e um tom irreverente que humaniza até mesmo os personagens mais poderosos. Sua abordagem vai além do simples alívio cômico, integrando o humor ao desenvolvimento dos personagens e explorando tanto situações absurdas quanto a dinâmica entre eles. Gunn tem o talento de equilibrar humor e emoção, criando cenas engraçadas que, ao mesmo tempo, aprofundam relações e revelam vulnerabilidades. Essa mistura garante que o filme não se leve excessivamente a sério, proporcionando leveza e diversão sem perder o foco na narrativa e na carga dramática dos personagens.

Superman representa uma revitalização bem-vinda do personagem e do universo cinematográfico da DC. Ao optar por um tom mais leve, colorido e fiel às raízes dos quadrinhos, e ao contar com uma interpretação sensível e autêntica de David Corenswet, a produção consegue resgatar a essência do herói de forma contemporânea e cativante. A inserção de outros personagens importantes reforça a ideia de um mundo interconectado, que promete expandir ainda mais as possibilidades narrativas. Com a direção de James Gunn equilibrando humor e emoção, o longa não só entretém, mas também emociona, posicionando o Superman como símbolo de esperança e humanidade para uma nova geração. Assim, este filme marca o início promissor de uma fase renovada e cheia de potencial para a DC nos cinemas.

Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

segunda-feira, 7 de julho de 2025

Shadow Force: Sentença de Morte - Ou quando o inimigo é o próprio filme

Shadow Force - Sentença de Morte | Lionsgate Films

Nos anos 1980 e 1990, os filmes de ação estadunidenses tiveram seu apogeu na indústria, lançando franquias e astros do gênero à nível internacional, e, lentamente, perderam a força e influência que outrora tinham. Agora, a ação vive de uma profunda crise que vem se arrastando há anos. Os filmes tornaram-se estagnados, as produções cada vez mais barateadas, empobrecidas de técnica e qualidade no geral.

Se Shadow Force: Sentença de Morte (2025), lançamento da Lionsgate (EUA)/Paris Filmes (BRA), prova alguma coisa é que o gênero ainda está respirando por aparelhos. No longa, Kyrah Owens (Kerry Washington) e Isaac Sarr (Omar Sy) já foram líderes de um grupo multinacional de forças especiais da CIA chamado Shadow Force. Eles quebraram as regras ao se apaixonarem e, para proteger o filho, passaram à clandestinidade. Com uma grande recompensa pelas suas cabeças e a vingativa Shadow Force no seu encalço, liderada pelo fundador do grupo e atual secretário geral do G7 Jack Cinder (Mark Strong). A luta de uma família torna-se uma guerra total.

A estória é a mais genérica possível e o diretor Joe Carnahan faz questão de deixar isso bem claro ao espectador com um falta de clareza em sua direção. Os atores parecem estar fora de sintonia com os acontecimentos em tela; o roteiro falta uma lógica interna que seja coesa; a base da narrativa é tão frágil que ela precisa que as personagens tomem decisões estúpidas para a trama avançar; a fotografia é mal iluminada em diversos momentos; a montagem das cenas de ação abusam dos truques de edição; a abordagem com a deficiência auditiva da personagem Isaac, que tinha potencial a ser explorado, beira ao cartunesco.

Isto resulta no fracasso do filme em duas vertentes: a primeira é a falta de envolvimento do público aos personagens ou, em outras palavras, o filme como um reflexo pela falta de esforço dos profissionais envolvidos com a produção; enquanto a segunda é no problema tonal do filme que passa do drama à ação: a carga dramática não tem nenhum sinal de pulso e as cenas de ação são quase cômicas na maioria das cenas. Nem mesmo o uso incessante de Lionel Ritchie consegue ajudar em alguma coisa.

Washington e Sy fazem aquilo que sabem fazer de melhor, mas parecem perdidos com a falta da supervisão de direção, e atores como Strong, que faz o vilão careca gostoso da vez e o ex-tóxico de Kyrah, e a ganhadora do OSCAR Da’Vine Joy Randolph, como uma aliada do casal apelidada de “titia”, são muito mal utilizados em personagens unidimensionais.

Assistir ao filme como uma comédia não-intencional ajuda um pouco no quesito “entretenimento”, principalmente no terceiro ato em que ocorre um exagerado tiroteio entre (quase) todos os personagens da trama. Mas isto não muda o fato de que o longa perpetua a decadência dos filmes de ação no cenário hollywoodiano. Se fosse uma paródia de um filme decadente do gênero dirigido por John Waters ou Paul Verhoeven (ou até mesmo Paul Feig), pelo menos seria divertido.

Porém, não importa que o estúdio gasta 40 milhões de dólares ou mais para lançar um filme nos cinemas, se ele tiver cara de um enlatado de streaming, então teria sido melhor lançar em um. Favor não descartar lixo nos cinemas, a gerência agradece.

                                                                  Autor:
                                  

Eduardo Cardoso é natural do Rio de Janeiro, Cidade Maravilhosa. Cardoso é graduado em Letras pela Universidade Federal Fluminense e mestre em Estudos de Linguagem na mesma instituição, ao investigar a relação entre a tragédia clássica com a filmografia de Yorgos Lanthimos. Também é escritor, tradutor e realizador queer. Durante a pandemia, trabalhou no projeto pessoal de tradução poética intitulado "Traduzindo Poesia Vozes Queer", com divulgação nas minhas redes sociais. E dirigiu, em 2025, seu primeiro curta-metragem, intitulado "atopos". Além disso, é viciado no letterboxd.



sexta-feira, 4 de julho de 2025

Jurassic World: Recomeço - Recomeço? Parece Mais um Replay Mal Programado

Jurassic World: Recomeço | Universal Pictures

Agentes habilidosos são enviados a uma instalação de pesquisa em uma ilha para recuperar DNA capaz de salvar espécies de dinossauros. Conforme a missão ultrassecreta se torna cada vez mais perigosa, eles acabam descobrindo um segredo sinistro que tem sido escondido do mundo por décadas.

A consagrada saga Jurassic Park deveria ter terminado no terceiro filme. Porém, buscando lucrar com a nostalgia, lançaram Jurassic World em 2015. O filme até consegue ser divertido e traz uma ideia interessante, mas sua execução deixa a desejar. Em 2018, veio a continuação, que, sinceramente, não me agradou. Já em 2022, foi lançado o terceiro filme dessa nova trilogia, que eu, honestamente, odiei — conseguiu ser o pior da franquia. E agora, em 2025, para espremer até a última gota da nostalgia, decidiram lançar mais um filme da franquia. Porque, claro, nada grita “inovação” como mais do mesmo: dinossauros correndo em CGI que já cansam desde os anos 90. Mesmo que a recepção seja negativa, é quase certo que o filme terá um bom desempenho nas bilheterias.

O filme começa em um laboratório, onde tudo dá absurdamente errado por causa de um inocente saco de doces que um funcionário distraído estava comendo — cena digna de Premonição. É aquele tipo de momento que já sinaliza o descuido com a lógica interna da história, uma brecha que poderia ter sido evitada com um mínimo de atenção ao roteiro. A partir daí, o caos é inevitável e se espalha rapidamente, como uma bola de neve desgovernada. Na sequência, o roteiro entra no piloto automático clássico da franquia: um milionário excêntrico aparece com seus planos duvidosos e motivações ambíguas, montando uma expedição que mais parece uma armadilha para os protagonistas. E, claro, não poderia faltar a inserção de crianças — porque, afinal, é um dos clichês mais batidos do gênero, um artifício para aumentar o apelo familiar, mesmo que não faça sentido no contexto da história.

Com a proposta de apresentar animais mutantes, o filme quase não mostra essas criaturas — e, quando aparecem, mal sabem o que fazer com elas. Até a ‘grande ameaça’ da vez, o temido D-Rex, parece ter saído de um brainstorm apressado, servindo apenas como figurante de vilão.

Em 2015, Jurassic World já admitia que o público aparentemente não se interessava mais por dinossauros “puros”, então decidiram inventar híbridos genéticos para tentar reanimar a atenção e o entusiasmo do público. A ideia até tinha potencial para explorar questões éticas sobre manipulação genética e os perigos da ciência descontrolada, mas, no final das contas, serviu apenas como um artifício para criar monstros maiores, mais assustadores e visualmente chamativos. Já em Recomeço, o discurso se repete como uma sombra cansada — o filme tenta se apresentar como uma “reinvenção”, mas acaba tropeçando nas mesmas ideias recicladas. O curioso (ou curioso só para quem presta atenção) é que o tal híbrido que desencadeia toda a confusão da trama foi criado muito antes do parque sequer existir, o que contradiz diretamente tudo que foi estabelecido nos filmes anteriores. Essa desconexão mostra o descuido com a coerência interna da saga e a prioridade clara em criar cenas de ação e monstros para impressionar o público, em vez de construir uma narrativa sólida. Mas, afinal, quem liga para lógica quando se tem um T-Rex estampando o pôster? O que importa é o espetáculo visual e o apelo nostálgico — o resto fica para segundo plano.

Jurassic World: Recomeço parece mais uma tentativa desesperada de lucrar com o que já foi sucesso do que um esforço genuíno de inovar ou respeitar a história que conquistou tantas gerações. Entre furos de roteiro, clichês reciclados e dinossauros mal aproveitados, fica a sensação de que estamos diante de uma franquia que perdeu o rumo — e que talvez já devesse ter ficado no passado, onde seu legado realmente brilha. Mas, enquanto houver nostalgia (e dinheiro) para ser explorado, os dinossauros vão continuar correndo, mesmo que a corrida não faça mais muito sentido.

Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

terça-feira, 1 de julho de 2025

M3GAN 2.0 - O terror foi embora, mas o caos e o sarcasmo ficaram

M3GAN 2.0 | Universal Pictures



Uma arma robótica de nível militar conhecida como Amelia torna-se cada vez mais autoconsciente e perigosa para a raça humana. Na esperança de detê-la, Gemma decide ressuscitar M3GAN, tornando-a mais rápida, forte e letal.

Diferente do filme anterior, que seguia uma linha mais voltada ao terror psicológico e remetia a produções como Chucky, mas com uma roupagem moderna centrada em uma boneca robótica, M3GAN 2.0 adota uma abordagem mais inclinada à ação. A transição de gênero é evidente desde os primeiros minutos, com uma estrutura narrativa que prioriza cenas dinâmicas, confrontos intensos e uma protagonista ainda mais letal e autônoma. Apesar dessa mudança de tom, o longa não abandona completamente suas raízes. 

Elementos do suspense e do horror tecnológico continuam presentes, especialmente na forma como a inteligência artificial é tratada como uma ameaça imprevisível. A ambientação, por sua vez, permanece no mesmo universo high-tech do primeiro filme, com laboratórios futuristas, dispositivos inteligentes e dilemas éticos sobre o avanço da tecnologia. O longa  pode até trocar o clima de horror por uma narrativa mais explosiva e movimentada, mas ainda carrega, em sua essência, as mesmas provocações sobre o controle da tecnologia e os limites da criação humana. Trata-se, portanto, de uma evolução do conceito original, que busca explorar novos caminhos sem perder totalmente sua identidade.

Dessa vez, a ameaça não vem de M3GAN, mas de uma nova boneca assassina: Amelia, uma criação ainda mais avançada e instável, cuja inteligência artificial representa um perigo iminente para a humanidade. Diante dessa nova ameaça, Gemma, a engenheira responsável por criar M3GAN no primeiro filme, decide reativar sua antiga criação como último recurso. A grande sacada da trama está justamente na maneira como ela reposiciona M3GAN, não mais como vilã principal, mas como uma espécie de anti-heroína. Essa mudança de eixo narrativo dá à personagem camadas mais complexas, promovendo uma dualidade interessante entre o que ela representa como máquina e as emoções quase humanas que demonstra. Longe de ser uma simples repetição do longa original — algo bastante comum em continuações dentro do subgênero slasher — M3GAN 2.0 busca romper com a previsibilidade e expandir sua mitologia de maneira criativa e funcional. A sequência, portanto, não se limita a ser um produto derivado, mas se firma como uma continuação com identidade própria, capaz de abrir espaço para futuras explorações nesse universo tecnológico sombrio.

Mas isso não significa que eu tenha gostado do filme. Pode até ser superior ao seu antecessor em termos de escala e ousadia, mas ainda assim não considero um bom longa. O roteiro, por mais absurdo que seja em diversos momentos, parece existir apenas como uma desculpa para colocar M3GAN no centro das atenções. A trama não se preocupa em desenvolver uma narrativa sólida ou coerente, e sim em criar situações que sirvam de vitrine para a boneca fazer o que o público já espera: instaurar o caos, provocar desconfiança entre os personagens e, claro, roubar a cena com seu carisma sarcástico e seus maneirismos peculiares. Cada aparição de M3GAN é meticulosamente construída para exibir sua personalidade híbrida — ao mesmo tempo ameaçadora e divertida. Seja pelo olhar calculado, pelas falas afiadas ou pelas ações imprevisíveis, ela domina a tela com uma presença quase magnética. O filme sabe disso e aposta tudo nela, deixando o enredo em segundo plano.

M3GAN 2.0 aposta numa abordagem mais voltada para a ação e destaca o carisma da boneca, que continua sendo o principal atrativo do filme. No entanto, o roteiro deixa a desejar, apresentando uma narrativa que prioriza cenas impactantes e momentos de espetáculo, em vez de um desenvolvimento mais sólido dos personagens e da história. Apesar dessas falhas, o longa consegue entreter, especialmente para quem já conhece e gosta da personagem. Ainda assim, fica claro que, embora superior em alguns aspectos ao primeiro filme, M3GAN 2.0 não consegue se firmar como uma sequência memorável ou que realmente expanda o universo de forma consistente.

Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Elio - Amizade intergaláctica, roteiro meio espacial

Elio | Disney

Elio se vê transportado pela galáxia e é confundido com o embaixador intergaláctico da Terra.

A animação segue a fórmula clássica do estúdio: um personagem pequeno diante de um mundo muito maior. Um exemplo disso é Toy Story, em que Woody e Buzz, sendo brinquedos, precisam se esconder dos humanos para não revelarem sua verdadeira natureza. Em Elio, o protagonista — uma criança — viaja pelo espaço, o que remete a Wall-E, tanto pela grandiosidade do cenário quanto pela jornada solitária do personagem. O filme aborda de forma sensível a solidão do protagonista, uma criança órfã e sem amigos, que encontra no espaço uma forma de escapar de sua realidade. Movido por uma paixão genuína pelo universo, ele tenta se comunicar com formas de vida extraterrestre — os alienígenas — numa busca por conexão e pertencimento. Essa premissa traz uma camada emocional interessante à narrativa, tornando a ficção científica mais humana e tocante.

Elio aposta em uma ideia interessante ao explorar a solidão e o pertencimento através de uma aventura intergaláctica, um tema que sempre desperta a curiosidade do público ao misturar elementos de fantasia com questões humanas universais. O roteiro propõe uma reflexão sobre como nos sentimos sozinhos mesmo quando cercados por outros, e como a busca por conexão pode ultrapassar fronteiras e até mesmo espécies. No entanto, apesar da premissa interessante e do potencial para um desenvolvimento mais profundo, o filme sofre com um desenvolvimento narrativo superficial e apressado, que prejudica o envolvimento do espectador com a história. A construção do Comuniverso, embora visualmente criativa e rica em detalhes gráficos, acaba por não ir além da estética. 

A ambientação, que poderia ser um ponto forte para ampliar a imersão, torna-se um cenário vazio que não contribui significativamente para a construção dos personagens ou para o avanço da trama. Os personagens alienígenas, apesar de terem um design interessante e único, carecem de uma complexidade emocional e motivações claras, tornando difícil para o público se conectar verdadeiramente com eles ou entender as nuances de suas ações. Dessa forma, Elio acaba desperdiçando parte do potencial de sua premissa, entregando uma experiência que, embora divertida e visualmente atraente, não consegue deixar uma marca duradoura na memória do espectador. O filme se apresenta como uma aventura leve e acessível, indicada para quem busca entretenimento descomplicado, mas dificilmente será lembrado por sua profundidade ou originalidade. Com um roteiro mais elaborado e uma exploração mais cuidadosa dos temas centrais, Elio poderia ter sido uma obra muito mais impactante e significativa.

A relação entre Elio e Glordon, apesar de suas diferenças marcantes, evolui gradualmente para um vínculo especial — e literalmente de outro planeta. Desde o primeiro encontro, a interação entre os dois personagens revela uma dinâmica repleta de contrastes, mas também de complementaridades inesperadas. Elio, com sua curiosidade humana e fragilidade emocional, encontra em Glordon, um ser alienígena com uma cultura e comportamento totalmente distintos, um contraponto que instiga o crescimento de ambos. A conexão que se forma entre eles é construída com sensibilidade e leveza. Essa amizade interespécies se desenrola de maneira natural, com pequenos gestos e diálogos que revelam aos poucos o quanto, apesar das diferenças óbvias, há um terreno comum na busca por pertencimento e aceitação. Assim, o filme reforça uma mensagem poderosa e universal: a amizade verdadeira pode florescer mesmo entre seres completamente distintos, superando preconceitos e medos, e criando laços que transcendem mundos e origens.

Elio apresenta uma proposta visual interessante e aborda temas como solidão e amizade, mas seu roteiro superficial limita o impacto emocional da história. Embora a relação entre Elio e Glordon seja sensível e cativante, o filme acaba sendo uma aventura agradável, porém pouco memorável. Com um desenvolvimento mais profundo, poderia ter sido uma obra muito mais significativa.


Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

Como Treinar o Seu Dragão (2025) - DreamWorks entra na onda do live-action com um ‘copia e cola’ caprichado

Como Treinar o Seu Dragão | DreamWorks


Na acidentada ilha de Berk, um garoto viking chamado Soluço desafia séculos de tradição ao se tornar amigo de um dragão chamado Banguela. No entanto, quando surge uma ameaça ancestral que coloca ambas as espécies em perigo, a amizade de Soluço com Banguela se torna a chave para forjar um novo futuro. Juntos, eles devem navegar pelo delicado caminho rumo à paz, alçando voo além das fronteiras de seus mundos e redefinindo o que significa ser um herói e um líder.

Este é o primeiro live-action da DreamWorks Animation, e sinceramente, não consigo imaginar o estúdio fazendo versões em carne e osso de outras de suas animações. Seria estranho ver uma adaptação de Madagascar, por exemplo. Por outro lado, uma versão live-action de O Caminho para El Dorado seria simplesmente perfeita. Engraçado que, nesse mesmo período, lançaram mais um live-action de uma obra criada pelo Chris Sanders — a outra sendo Lilo & Stitch. Se eu ganhasse um real toda vez que isso acontece, não é muito, mas é cômico que, no mesmo período, tivemos dois! Faz sentido ter uma versão live-action de Como Treinar o Seu Dragão pelo estilo visual relativamente realista e pelo fato de ser protagonizado por humanos. Embora os dragões sejam parte essencial da história, eles podem ser perfeitamente recriados graças ao avançado CGI. Além disso, vendo o sucesso que sua concorrente está fazendo ao transformar suas animações em versões live-action, a DreamWorks não perdeu tempo e apostou em uma adaptação de um dos seus ovos de ouro.


O filme é praticamente uma cópia fiel da animação original, mantendo a mesma história central com poucas alterações nos detalhes. Essas mudanças, embora sutis, tentam dar uma nova cara à narrativa, mas não chegam a transformar a essência da trama. Por exemplo, numa cena importante em que Astrid descobre o segredo de Soluço — que ele está escondendo um dragão — há uma pequena diferença entre as versões. Na animação, Banguela prende Astrid a uma árvore, criando um momento de tensão e humor característicos. Já no live-action, essa mesma cena acontece num penhasco, o que muda um pouco a dinâmica, dando um tom mais dramático e perigoso à situação. São essas pequenas alterações que tentam diferenciar o filme, mas que no geral não escapam do tradicional “copia e cola” da obra original. Mas isso não quer dizer que o filme seja ruim — muito pelo contrário. Mesmo sendo uma reedição do que já vimos na animação de 2010, isso não impediu que eu gostasse da adaptação. Diferente do Rei Leão (2019), que me pareceu um filme sem alma, uma mera cópia e cola, onde os animais, apesar do visual impressionante, não tinham expressões faciais que transmitissem emoções de verdade.


A história comove ao retratar de forma sensível o vínculo que se desenvolve entre Soluço e Banguela. No começo, Soluço é guiado pelo medo e pelos preconceitos enraizados em sua sociedade, mas aos poucos percebe que o dragão não representa perigo — pelo contrário, é uma criatura com sentimentos, tão sensível e solidária quanto qualquer ser humano. Essa mudança representa o crescimento do personagem principal e traz uma crítica sutil à intolerância e à violência sem razão. Ao mostrar o "inimigo" de forma mais humana, o filme provoca uma reflexão sobre o verdadeiro significado de coragem, força e convivência, revelando uma profundidade que vai além da superfície da narrativa.

 

O CGI dos dragões é realmente impressionante. Cada movimento, desde o bater das asas até os pequenos gestos, é cuidadosamente trabalhado para transmitir uma sensação incrível de realismo e personalidade. As texturas das escamas, o brilho nos olhos e as expressões faciais são tão detalhadas que os dragões parecem criaturas verdadeiras, com emoções palpáveis. Banguela, em especial, ganha vida de forma tão convincente que é fácil esquecer que ele é totalmente digital — ele demonstra uma gama completa de sentimentos, desde a travessura até momentos de ternura, trazendo para a tela toda a emoção e carisma que a animação já havia conquistado. Essa qualidade técnica não só impressiona visualmente, mas também fortalece a conexão do público com a história, tornando a experiência muito mais envolvente e memorável.


A essência dos personagens humanos da animação também está muito bem preservada no live-action. Os protagonistas mantêm suas características e personalidades marcantes, o que é fundamental para preservar a conexão emocional que o público já estabeleceu com a história. Mesmo com a transição para atores reais, as nuances de cada personagem são cuidadosamente mantidas — desde as inseguranças e dúvidas de Soluço até a coragem e determinação de Astrid. A química entre o elenco é evidente, trazendo autenticidade às relações que já conhecemos e amamos. Além disso, as motivações e conflitos internos permanecem fiéis ao original, garantindo que a alma da narrativa não se perca na adaptação. Essa fidelidade ajuda a criar uma ponte entre fãs antigos e novos espectadores, fazendo com que a experiência seja genuinamente envolvente para todos.


Como Treinar o Seu Dragão em live-action é uma adaptação que honra a essência da animação original, trazendo à tela uma história familiar com visuais deslumbrantes e personagens bem interpretados. Embora não se arrisque muito, optando por seguir fielmente o roteiro conhecido, o filme se destaca pelo impressionante trabalho do CGI, especialmente na criação dos dragões, e pela química autêntica entre os atores humanos. Para quem é fã da franquia, é uma experiência que reforça o carinho pelos personagens e seu universo; para novos espectadores, uma porta de entrada visualmente rica e emocionante. Talvez não seja uma revolução no gênero, mas é, sem dúvida, uma homenagem digna e encantadora a um dos grandes sucessos da DreamWorks.


Autor:


Meu nome é João Pedro, sou estudante de Cinema e Audiovisual, ator e crítico cinematográfico. Apaixonado pela sétima arte e pela cultura nerd, dedico meu tempo a explorar e analisar as nuances do cinema e do entretenimento.

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