domingo, 1 de setembro de 2024

India Song - A Burguesia como uma Lepra Melancólica

 

India Song | Les Films Armorial

Em India Song, a diretora e romancista Marguerite Duras mostra vida de Anne-Marie Stretter, que é casada com um diplomata francês que trabalha num consulado francês na Índia. Anne-Marie, mesmo casada, se relaciona com outros amantes e narra sua história até o momento, pouco depois de ter saído da Índia. O filme é de 1975, mas a história acontece em 1937.

Necessário apontar que o filme não tem falas dos personagens, apenas narrações deles que vão se conectando ao longo da trama. A direção utiliza muito da ação extra campo, seja no som e até mesmo em certas ações dos personagens. Isso acontece logo de cara quando a abertura do filme é o pôr do sol não sendo no horizonte, e sim entre as nuvens. Mostrando algo oculto que está subindo pelo horizonte, uma sujeira, que da mesma forma é falada de forma bastante irônica pela protagonista. 

Em certo momento do filme, na sua primeira meia hora, Anne faz o seguinte comentário na narração: "-Sabia que os leprosos não morrem lentamente? Eles estouram..." um dos amantes perguntou se eles sentiam muita dor, e ela respondia "-... eles gargalham.". É importante enfatizar o como ela fala dos indianos na mesma forma que Maria Antonieta falava daqueles que passavam fome antes da Revolução Francesa, frase que apareceu escrita pela primeira  vez no livro "Confissões" de Rousseau: "se não tem pão, comam brioches.". 

Não à toa a direção não mostra muita proximidade em cena dos atores se relacionando além de certas danças e caminhadas, enfatizar o espelho como a visão do espectador sobre aqueles relacionamentos que são falsos em sua essência. No cinema, a verdade absoluta não existe e jamais irá aparecer em algum momento, e Duras sabe disso. O reflexo daqueles que estão em cena mostra que não existe um pingo de verdade naqueles que estão em cena. A cada momento que eles se aproximam mais da verdade, mais eles caminham em direção a morte. 

Isso também é enfatizado por cada plano do filme ter uma direção de arte e condução dos atores sendo uma tentativa ser quase uma pintura Barroca, querendo aproximar aquela classe burguesa em algo angelical e sentimental, que não se mistura com os "leprosos". A trilha sonora que se repete várias vezes durante a narrativa, coloca os personagens como se estivessem em um limbo no qual não sabem se querem ficar ou sair. E no momento que decidem sair, começam a se auto destruir. 

Necessário apontar que a história de passa em 1937, pré-Segunda Guerra Mundial e mais países se libertando de suas colonizações durante o início do século XX. India Song conta a história de uma classe que faz de tudo para fugir do mundo real, que não se importam em escutar a mesma música todos os dias, dançar da mesma forma todos os dias, de ver a mesma paisagem enevoada sem outras pessoas por perto diariamente, porque o contato com o mundo real os fazem acordar para um mundo que não quer mais saber deles. 

Oque fazer em um mundo que não quer saber de suas melancolias banais e seus conflitos amorosos? Só sobra desaparecer. 

Assistido e Debatido no Cineclube Sganzerla. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O Desprezo - O Cinema como Espelho

O Desprezo | Les Films Concordia O Desprezo (Le Mépris), é um drama francês de 1963, dirigido por Jean-Luc Godard, que explora a crise de um...